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segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

Mesmo que chova

É evidente que as escolas devem ser dirigidas por professores, pois as escolas são centros educativos e os professores é que entendem de educação. Mas é igualmente certo que, sendo possível, as escolas devem ser geridas por gestores profissionais, visto que, apesar de serem centros educativos, a tarefa que está em causa é uma tarefa de gestão. E os professores pouco entendem de gestão.

Dirigir e gerir são tarefas muito diferentes. Dirigir é orientar, é ser chefe: encaminhar outras pessoas por um caminho que é bom para elas; encontrar os declives que conduzem ao bem comum e ao bem de cada um; ter maior preocupação com as pessoas do que com as coisas. Gerir é fazer contas e tratar da manutenção dos meios materiais. E é uma tarefa menor, embora necessária, numa escola.

É um erro colocar educadores a fazer contas, e é outro erro confiar a gestores a orientação de pessoas.

Se uma eventual má experiência de ter professores a gerir as escolas conduzir à decisão de passarmos a ter gestores a dirigi-las, trocaremos um erro por outro erro. Certamente um erro menor por um erro maior.

Uma escola devia ser dirigida por professores, que deviam ser educadores. E poderia ser gerida por gestores, de modo a libertar os educadores para as tarefas que lhes são próprias.

Há muito tempo que a tarefa de governar se tornou quase só na tarefa de gerir dinheiros públicos. E, por isso, há muito também que a educação passou a ser para os governantes - tal como a saúde, por exemplo - fundamentalmente uma questão de dinheiro. Não é de estranhar, portanto, que se fale em entregar a direcção das escolas a gestores profissionais...

Quando falam de gestores profissionais para as escolas estão a falar de um assunto da área económica e não de uma questão educativa. E seria interessante que se falasse de questões educativas quando se fala de educação.

As verdadeiras questões da educação resultam de que nas escolas há pessoas jovens, que devem ser ajudadas, tanto quanto possível, a serem felizes. E em que a felicidade dessas pessoas, como a de todas as outras, consiste em satisfazerem a ânsia profunda que têm de verdade, de bem e de beleza. Não em terem coisas e conforto.

As escolas não são - e é essa a visão da economia - caixotes cinzentos cheios de equipamentos e estruturas, como cadeiras, mesas, computadores, bares e cantinas. São lugares sempre bonitos porque estão cheios de crianças, e as crianças, em grande parte, têm ainda os olhos limpos e a alma limpa. Têm aquela ingenuidade encantadora que lhes permite pensarem que nós, os adultos, somos bons...

"A melhor escola onde estive - disse-me uma vez uma colega - era uma espécie de barracão com salas onde chovia e entrava vento quase como na rua". A melhor escola não é a que tem boas condições materiais e é bem gerida. É, antes, aquela onde às crianças capazes de pensarem que os adultos são bons se juntam adultos que querem ser bons e sonham com tornar felizes as crianças. Nessa escola, mesmo que chova, há alegria e sonhos; aprende-se muito e aprendem-se coisas daquelas que são importantes.

Pode ser que a escola precise de gestores; mas precisa, muito principalmente, de educadores. Essa é que é a grande questão, na qual todos têm evitado tocar. Educadores são as pessoas raras que é preciso encontrar. Não há muitos educadores. O que há é aquilo a que chamamos professores e deveríamos chamar instrutores, porque se limitam quase todos a transmitir informação técnica das suas áreas específicas, sem tocarem na formação dos alunos como pessoas, em colaboração com os pais.

Se quiserem, coloquem nas escolas uma pessoa que faça as contas da cantina e do bar, substitua as lâmpadas fundidas e controle os gastos com detergente. Só não entendo é por que razão devemos entender que estão a ser tomadas, dessa forma, medidas educativas.




Paulo Geraldo

Maria de Lurdes Rodrigues, em artigo de opinião

Escolaridade obrigatória até aos 18 anos: Um desafio que respeita a todos

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O alargamento da escolaridade obrigatória até aos 18 anos de idade é uma das mais importantes medidas recentes de política educativa.

Haverá quem considere que se trata de um passo natural, actualizando as metas do progresso educativo mais de 20 anos depois da aprovação da escolaridade básica obrigatória de nove anos, até aos 14 anos de idade, em 1986. Todavia, aquele objectivo apenas foi atingido em 1996, quando a taxa de escolarização aos 14 anos chegou aos 100%, depois, nomeadamente, de um grande investimento no combate ao trabalho infantil. Mais, apenas nestes últimos três anos se conseguiu que a grande maioria dos jovens concluísse com êxito o 9.º ano.

Em resumo, levámos 20 anos a concretizar a ambição de 1986. Durante todo esse período, enfrentámos muitas dificuldades para concretizar os princípios da escolaridade obrigatória, sobretudo em termos de conclusão com êxito do 9.º ano: milhares de jovens abandonavam precocemente a escola, depois dos 14 anos, sem antes concluir o ensino básico. Não surpreende pois que o Recenseamento de 2001 tenha revelado a presença, no mercado de trabalho, de mais de 250.000 jovens, com idades entre os 18 e os 24 anos, que não tinham concluído o 9.º ano.

Existe hoje a convicção de que, desta vez, o país não pode esperar 20 anos para alcançar os seus novos objectivos. Porém, é necessário ter consciência de quais são as consequências, para as escolas e para o trabalho dos professores, que resultam de estarem na escola, obrigatoriamente, todas as crianças, adolescentes e jovens até aos 18 anos. As dificuldades e os obstáculos já hoje sentidos, serão certamente ampliados.

Para os superar, as escolas e a política educativa terão de responder a três grandes desafios.

Em primeiro lugar, o desafio da autonomia e do reforço da capacidade de gestão e de lideranças nas escolas. Para responder à heterogeneidade dos alunos, o sistema educativo precisa de diversificar as soluções, os instrumentos de ensino, as ofertas formativas e as estratégias pedagógicas, como precisa de envolver outras instituições e profissionais. Neste quadro, a autonomia deve ser um efectivo instrumento de gestão da diversidade, sendo indispensável continuar a melhorar as condições de gestão e de liderança das escolas.

Em segundo lugar, o desafio da qualidade das aprendizagens de todos os alunos. Testes internacionais como o PISA, os exames nacionais e as provas de aferição constituem alguns dos instrumentos mobilizáveis para garantir, por avaliação externa, essa qualidade. Neste quadro, as escolas serão cada vez mais solicitadas a responder pelos resultados obtidos pelos seus alunos, sendo por isso indispensável mitigar a desigualdade hoje existente entre elas e elevar a sua qualidade média, garantindo em particular maior equidade na distribuição dos recursos educativos.

Finalmente, o desafio da convicção. Se aceitamos o princípio da escolaridade longa e obrigatória para todos, precisamos de acreditar que todos podem aprender, que todos podem ser ensinados, mesmo aqueles que têm mais dificuldades ou menos motivação, ou que não têm uma família que exija e estimule a ir mas longe. Não se trata de convicção cega, mas o resultado do conhecimento da experiência de outros países que já atingiram o objectivo que agora nos propomos.

O desafio da qualificação respeita a todos. As famílias não podem naturalizar e desculpar o insucesso escolar, devem ser exigentes e transmitir aos jovens a convicção de que aprender é um tanto um direito como um dever. Os jovens, sobretudo os mais desmotivados, necessitam da confiança dos pais e dos professores para acreditarem em si próprios e ultrapassarem os bloqueios que os impedem de estudar. As escolas e os professores devem, apesar das dificuldades, inscrever na sua missão o princípio de que nenhuma criança pode ser deixada para trás. Por fim, o Estado tem a obrigação de garantir que a escola pública tem e terá todas as condições para cumprir as metas que hoje lhe atribui.

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Maria de Lurdes Rodrigues, em artigo de opinião II

Educação: Compromissos ou cheques em branco?

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As eleições são um tempo de escolhas em função dos compromissos que os partidos apresentam ao eleitorado.

No domínio da educação, os partidos da oposição estão centrados nas temáticas da carreira e da avaliação dos professores. Colocando estas temáticas no centro da política educativa, omitem ou subalternizam, nos programas eleitorais como no debate público, a referência à maioria das medidas concretas de política educativa lançadas nos últimos quatro anos.

A escola pública mudou muito com este Governo, e mudou para melhor. Hoje, há mais alunos a frequentar e a concluir com êxito o 9.º ano, há mais alunos a frequentar e a concluir com êxito o ensino secundário, há mais alunos a entrar no ensino superior. Hoje, os professores são, finalmente, colocados por ciclos de quatro anos, beneficiando eles e as escolas de muito mais estabilidade. No 1.º ciclo, ampliou-se e melhorou-se o serviço público de educação com a instituição da escola a tempo inteiro e a construção de novos centros escolares, em colaboração com as autarquias. São hoje maiores os apoios às famílias na educação dos seus filhos, devido ao alargamento da base de incidência da acção social escolar, a qual abrange já cerca de 700.000 alunos. Nas escolas secundárias públicas, multiplicou-se o número de cursos profissionais e de alunos, que são hoje mais de 120 mil. Em todas as escolas básicas e secundárias, existe hoje, para todos os alunos e professores, um número suficiente de computadores com boas condições de acesso à Internet. Criámos uma rede de centros Novas Oportunidades em todo o país, a qual serve cerca de um milhão de adultos que procuram actualizar as suas qualificações. Hoje, estão em renovação e modernização mais de 200 escolas secundárias, nas quais se fará o maior investimento de sempre (2,5 mil milhões de euros), com o objectivo não só de as recuperar como de as preparar para o futuro.

Objectivamente, considerando tudo o que foi e está a ser feito, não me parece possível considerar os resultados despiciendos, como não me parece possível ignorar as consequências das mudanças para alunos, pais e professores. Por isso, hoje, legitimamente, muitos portugueses podem e devem perguntar aos líderes da oposição o que pensam fazer em relação aos principais programas ou linhas de intervenção acima referidos.

As escolas e as famílias, mas também as autarquias e as IPSS têm o direito e o dever de exigir uma clarificação sobre o que está ausente ou vago nos programas eleitorais.

O Governo do PS que agora termina o seu mandato definiu como prioridade a modernização das escolas e do serviço público de educação. Para concretizar esta prioridade não só foram atribuídos à educação recursos humanos e financeiros adicionais, como foram desenhados programas específicos que permitiram resolver, com metodologias adequadas, alguns problemas que, de tão antigos, pareciam insolúveis. Foi o caso, em particular do programa da Parque Escolar, que está finalmente a permitir superar o estado de degradação e abandono dos edifícios escolares. Mas foi também o caso do Plano Tecnológico da Educação.

No seu programa eleitoral, o PS compromete-se a continuar esta política de promoção da qualidade da escola pública.

O PS compromete-se a dar continuidade ao programa Novas Oportunidades e à certificação escolar dos adultos, de importância estratégica para o país e que envolve o emprego de milhares de jovens diplomados na rede de centros para o efeito criados. Em mais nenhum programa eleitoral se encontra um compromisso claro com este programa. Vai o PSD, se amanhã for governo, continuar com o programa Novas Oportunidades e com o esforço financeiro que este requer?

O programa de modernização das escolas secundárias, que para incluir todas as escolas necessita de um elevado investimento prioritário, não merece qualquer referência nos programas eleitorais dos partidos da oposição. Mais significativo ainda, o estado de degradação física e de obsolescência dos equipamentos oficinais nas escolas não merece qualquer referência nos programas eleitorais do PSD, do PCP e do CDS. Comprometem-se estes partidos com a continuidade da acção da Parque Escolar e com o esforço financeiro que ela requer, ou vão descontinuá-lo à primeira oportunidade se acaso estiverem no próximo governo?

A promoção do acesso às tecnologias de informação e comunicação, em particular através do programa e-escola, permitindo que todos os alunos, professores e formandos, possam ter acesso às TIC em casa, é ignorado nos programas dos partidos da oposição. Significa isto que não se comprometem com a sua continuidade e, portanto, com o seu financiamento?

O reforço, contratualizado com as escolas, dos recursos humanos e financeiros necessários para apoiar a melhoria da qualidade das aprendizagens, em especial através do Programa de Acção para a Matemática e do Plano Nacional de Leitura, cujos bons resultados no sucesso escolar estão comprovados por avaliações externas, são ignorados nos capítulos da educação dos programas eleitorais dos partidos da oposição. Significa isto que não se comprometem com a sua continuidade e com as transferências de recursos que essa continuidade requer?

Os exemplos podiam multiplicar-se. Porque não se comprometem os partidos da oposição com a continuidade do ensino do inglês no primeiro ciclo, com a generalização das refeições escolares, com o prolongamento do horário das escolas do primeiro ciclo, com o apoio às autarquias na racionalização da rede do primeiro ciclo, etc., etc? "Apenas" para não terem de reconhecer méritos à acção governativa do PS no sector da educação, ou para os poderem descontinuar se por improvável acaso ganharem as eleições?

Na hora de votar os portugueses sabem que o PS dará continuidade a estas medidas de política educativa e ao esforço financeiro que elas pressupõem.

A saúde como perspectiva


O objectivo do Media Smart é fornecer às crianças ferramentas que as ajudem a compreender e interpretar a publicidade, preparando-as para fazerem escolhas informadas.

Divulgamos hoje o texto do perito Media Smart da área da saúde, Dr. Pedro Ribeiro da Silva.




A saúde como perspectiva

As crianças que actualmente têm até 12 anos, vivem uma realidade muito diferente da dos seus pais quando tinham a mesma idade, e quase não existem pontos de comparação com o quotidiano dos seus avós quando eram crianças.

Hoje, um jovem é diariamente, exposto a muito mais informação que os seus pais ou avós foram, na sua época.

Em Portugal, uma criança entre 7 e os 10 anos vê em média 16 horas de televisão por semana. Nesse período de tempo assistem a múltiplos programas e centenas de spots publicitários com informação profusa sobre quase todas as áreas da vida e do consumo.

Por ser tão abundante, parte dessa informação é divergente ou pode até opor-se ou ser antagónica.

A informação é benéfica e fundamental para a autonomia e crescimento individual, todos os dias fazemos inúmeras escolhas, para as quais é necessário estar fundamentadamente informado.

No entanto, é frequente ver jovens e adultos fazerem, por exemplo, determinadas escolhas alimentares por pensarem que são as mais adequadas, mas que são exactamente o oposto.

A informação que as baseia é parcelar ou confusa e acaba por resultar no contrário do seu objectivo.

Esta situação torna-se ainda mais complexa por a oferta disponível no mercado se ter expandido enormemente.

Ao comparar a quantidade de produtos alimentares disponíveis, actualmente, com o período de há 20 anos ou de há 40 anos, verifica-se que a oferta aumentou muitíssimo o que complexifica a escolha.

E os factores que condicionam uma simples escolha alimentar também aumentaram imenso.

Há 40 ou mesmo 20 anos, as preocupações com ómega 3, bifidus, licopene, calorias, anti-oxidantes, era praticamente inexistente.

As escolhas eram muito mais simples de fazer.

Devido a existir tanta informação que é difícil de gerir individualmente perante as decisões do quotidiano, verifica-se que este aumento de informação é acompanhado por mecanismos psicológicos de diminuição da ansiedade. Com frequência, acabamos por fazer as nossas escolhas com pouca informação, porque de outra forma qualquer decisão poderia implicar muito stress ou provocar até bloqueio mental com incapacidade de opção.

Esta estrutura, que Abraham Moles descreve como cultura mosaico, significa que temos muita informação disponível, mas essa informação é usada individualmente de forma aleatória, desordenada e fragmentada.

Actualmente, recebemos mais informação através dos meios de comunicação que através das relações interpessoais, as decisões são mais individuais e menos partilhadas, como se passava até há poucos anos, em que grande parte da informação provinha das pessoas próximas, era em menor quantidade e menos contraditória.

Warwick Cairns, num livro publicado em Inglaterra, em 2008, descreve este fenómeno, baseando-se em dados estatísticos do Reino Unido e Estados Unidos da América.

Cairns, explicita que nos anos 70 do século XX, a maioria das crianças podia ir a pé para a escola, andar de bicicleta e brincar na rua. Nos anos 90, tudo tinha mudado. Em vinte anos, a superfície em que uma criança se pode mover livremente diminuiu 9 vezes. Em 1970, oito em dez crianças iam a pé para a escola, já em 2007, apenas uma em cada dez.

Este aumento da sedentariedade, devido em grande parte a questões de segurança, é uma das razões para as crianças verem várias horas de televisão diária e fazerem menos exercício físico. Como explicita Cairns, baseando-se num estudo de 2007, em Inglaterra, verificou-se que aos onze anos só um rapaz em vinte faz a actividade física aconselhável para a sua idade e que, nas raparigas, apenas uma em cada 250. Possivelmente este facto está relacionado com os 25% de jovens dos onze aos quinze anos que são clinicamente obesos, sendo a sua tendência para aumentar.

A percepção do risco passou a estar muito marcada pela informação dos meios de comunicação social, que com frequência, influenciam mais os comportamentos das pessoas que a própria realidade.

Morreram 5 pessoas em Inglaterra devido à BSE e não morreu ninguém devido à gripe das aves, no entanto, essas duas situações provocaram um medo generalizado por toda a Europa, com grande decréscimo do consumo de carne de bovino e de aves, respectivamente.

A informação profusa sobre os diversos produtos e situações do quotidiano tornam difícil uma decisão e são de valorizar todas as estratégias que permitam o enquadramento dessa informação.

Por essa razão, é de saudar o aparecimento de um projecto como o Media Smart, que tem como objectivo principal aumentar a literacia sobre a Publicidade nos seus diversos meios.

O projecto foi testado em outros países e adaptado à realidade portuguesa.

Destina-se a crianças dos 7 aos 11 anos, e consideramos que toda a estratégia pedagógica e os materiais didácticos produzidos podem ser um excelente contributo para que os alunos pensem a publicidade de uma forma crítica, tornando-se num utensílio importante para fazerem escolhas coerentes.

Os responsáveis do Projecto convidaram técnicos de áreas institucionais como a educação, a defesa do consumidor e a saúde, para que em conjunto pensassem o programa Media Smart a sua execução e implementação.

Desse trabalho conjunto, surgiram várias alterações ao programa inicial, de modo a adapta-lo à realidade portuguesa.

Parece-nos que o Media Smart é já um sucesso, pela qualidade dos materiais pedagógicos, pela sua implementação em muitas escolas, assim como pelo testemunho de alunos, professores e pais.

Pedro Ribeiro da Silva
Direcção-Geral da Saúde

Artigo de Opinião



Link: Artigo de Opinião

Não são manuais escolares, são livros de entretenimento


Conselho editorial da Porto Editora garante que não há “qualquer discriminação” nos livros de atividades para meninos e meninas e volta a colocá-los à venda. Editora refere que fez uma “análise serena e ponderada do caso”, assegura que não há “matéria objetiva e relevante” para retirar livros dos pontos de venda, e refuta várias observações feitas pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género.

Os blocos de atividades para meninos e meninas dos 4 aos 6 anos de idade, que tanta polémica e debates causaram no último mês, voltam a estar à venda. A Porto Editora (PE) chegou a suspender a venda desses livros após críticas de discriminação feitas pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG). A editora e a CIG reuniram-se entretanto e anunciaram que vão trabalhar em conjunto na produção de materiais destinados a crianças. O conselho editorial da empresa livreira esteve a analisar o caso e resolveu voltar a colocar os livros no mercado para compra livre. 

Segundo a editora, não há motivos para a retirada definitiva desses livros. “(…) tendo-se concretizado os objetivos pretendidos, e comprovada a não existência de qualquer discriminação, põe-se fim à suspensão da venda daqueles livros no quadro do exercício pleno da liberdade de expressão da autora e das ilustradoras, bem como da liberdade de edição, respeitando estes valores fundamentais”, sustenta a PE em nota da Direção Editorial. 

A empresa adianta que a suspensão da venda deveu-se à vontade de fazer “uma análise serena e ponderada do caso, sem ceder às pressões e avaliações imediatistas e precipitadas, e como forma de denunciar a lamentável manipulação que esteve na origem da polémica”. Debruçou-se então sobre o parecer técnico da CIG, que, entre outras coisas, referia que os livros promoviam a discriminação e diferenciação entre homens e mulheres, e refuta várias observações desse documento.  
  
“A Porto Editora tem plena consciência da sua missão e da sua responsabilidade na promoção do desenvolvimento educacional, cultural e civilizacional. Um compromisso que honra diariamente, procurando fazer sempre mais e melhor nas diferentes áreas editoriais em que atua e, dessa forma, satisfazer a pluralidade de gostos, interesses e necessidades das suas leitoras e dos seus leitores”, lê-se na nota da Direção Editorial. 

Os blocos de atividades, com capa azul para meninos e capa cor-de-rosa para meninas, com vários exercícios para crianças dos 4 aos 6 anos, estiveram no centro das atenções no último mês. A editora e a CIG reuniram-se, acertaram uma estreita colaboração, e anunciaram um trabalho conjunto na promoção de “conteúdos que fomentem uma educação promotora de igualdade de oportunidades e do desenvolvimento das diferentes capacidades e talentos de todas as crianças, contribuindo assim para a construção de uma sociedade em que mulheres e homens exercem uma cidadania plena”. 

Bolas para meninas, peluches para meninos 
A PE leu com atenção o parecer técnico da CIG, agradece o trabalho realizado, mas considera que não há “matéria objetiva e relevante que justifique” a recomendação de retirar os livros dos pontos de venda. “As liberdades artística e criativa da autora, ilustradoras e editora não podem ser condicionadas por questões de gosto, no mínimo, subjetivas e discutíveis”, conclui. A editora refuta comentários feitos pela CIG e esclarece que os blocos de atividade não são manuais escolares ou de apoio à escola, nem tão-pouco fazem parte de um programa letivo e, por isso, na sua opinião, “é errada qualquer associação destas edições ao contexto da escola”. 

“Ao contrário dos manuais escolares, estes blocos têm uma função diferente, implicam um contacto superficial com as crianças, assumindo um papel de entretenimento, repleto de ludicidade, ainda que explorando competências importantes para a faixa etária a que se destinam. Por isso, parece-nos muito exagerado considerar que a realização deste tipo de blocos de atividades de alguma forma condicione, no futuro, as opções pessoais e profissionais das crianças”, refere a PE no relatório que elaborou.

Os blocos de atividades são livros que têm folhas destacáveis para fins lúdicos e ocupação de tempos livres. Nos dois em questão, o conceito assentou, segundo a editora, “na elaboração de dois blocos de atividades lúdicas com o mesmo conteúdo em termos de competências a abordar, com a mesma tipologia de exercícios e grau de complexidade”. 

“Na forma, um dos blocos deveria ser mais destinado aos rapazes/meninos, contendo elementos gráficos e situações próximos dos seus gostos e preferências mais comuns e o outro, mais ao agrado da maioria das meninas/raparigas. Para tal, cada livro foi entregue a uma ilustradora diferente que livremente desempenhou um trabalho criativo e artístico. Não se conhecem, nem viram o trabalho uma da outra”, adianta a PE. 

Os conteúdos foram concebidos por uma educadora de infância, a execução foi acompanhada por uma coordenadora editorial, a parte gráfica ficou a cargo de uma designer e duas ilustradoras. A empresa livreira assegura que estas mulheres não tiveram como objetivos reforçar a segregação de género ou diferenciar o grau de dificuldade das atividades. Além disso, explica, a seleção das cores e dos elementos gráficos das capas obedeceu a “critérios estéticos e comerciais e à liberdade criativa das ilustradoras”. 

Há bolas no bloco das meninas e peluches no dos meninos e numa das atividades tanto a menina como o menino arrumam os seus quartos. “A maior parte das atividades dos blocos atribui gostos comuns a meninas e rapazes: contacto com a Natureza, animais domésticos e selvagens; atividades extracurriculares; tempo livre com os avós; livros; doces; atividades culturais e desportivas; convívio com os amigos; colecionismo”, exemplifica. 

“Importa esclarecer também que estas obras não foram desenvolvidas sob uma perspetiva comparativa, pelo que consideramos despropositada e desadequada essa abordagem que surgiu nas redes sociais e que, em grande medida, serviu de fundamento ao parecer da CIG”. A PE justifica os blocos de atividades com uma opção editorial e lembra que a compra é livre. “A igualdade de oportunidades não está comprometida, porque todos podem ter acesso à obra que entenderem”. 

A empresa livreira, líder no setor, sublinha que o rigor, a responsabilidade, a proximidade, a excelência e a inovação são valores com que trabalha diariamente e que todas as publicações para crianças “obedecem a grandes cuidados editoriais, congregando o esforço de uma equipa vasta e especializada, incluindo editores, autores, consultores, ilustradores, designers, etc., com profundo conhecimento da área”. E no início do relatório recorda o que diz a Constituição Portuguesa sobre os direitos da liberdade de expressão. 

Informação retirada daqui 

Como ensinar crianças do 1.º Ciclo a não darem erros


Maria Regina Rocha, uma das autoras do Programa e Metas Curriculares de Português do 1.º Ciclo, afirma que se os alunos dão erros então é necessário identificar as causas, explicar regras, fazer exercícios. As crianças que aprendem a escrever devem visualizar e ouvir as palavras. “Eu não dou erros!” é um livro que responde a muitas dúvidas.

A ortografia é um tema de todos os dias. Nos primeiros contactos formais com as palavras, os alunos do 1.º Ciclo do Ensino Básico podem ter dúvidas. Há sons que podem ser escritos com letras diferentes, há palavras que soam de igual forma e que não se escrevem da mesma maneira. “É natural que haja dúvidas porque o sistema é complexo”, diz Maria Regina Rocha, uma das autoras do Programa e Metas Curriculares de Português do 1.º Ciclo, coautora do livro “Eu não dou erros!” com Maria Helena Marques. Um livro para professores, alunos e todos os que querem sentir-se seguros na ortografia. 

A escrita foi evoluindo ao longo dos tempos, não é um código de transcrição exata, e quando uma criança se apercebe que um som pode ser grafado com diferentes letras, surgem dúvidas e os erros podem acontecer. A ortografia é a forma correta de escrever as palavras e é um assunto sério tanto mais no 1.º Ciclo, no primeiro contacto com letras, palavras, frases. Neste nível de ensino, o mais importante é ensinar as regras, as exceções são explicadas mais tarde. “A criança do 1.º Ciclo tem de dominar a regra”, afirma a professora, licenciada em Filologia Românica e mestre em Ciências da Educação, autora de vários livros. 

Há várias formas de adquirir o domínio da ortografia. Desde logo, os contextos e as práticas sociais de linguagem são importantes para aprender a escrever corretamente. O que os adultos dizem, como falam, como escrevem, funciona como exemplos para os mais pequenos. “A palavra correta é indicada à criança em contextos informais, normalmente por adultos”, lembra a autora do livro. E a leitura é fundamental. Ler é uma forma de ganhar bases sólidas para uma escrita correta. Ler com frequência e atenção, ler textos cada vez mais complexos. Escrever textos também é importante. “A produção regular de textos e a respetiva revisão levam à automatização da escrita”, sublinha Maria Regina Rocha.    

Consultar dicionários e prontuários desde idades precoces dá segurança a quem escreve e ajuda a dominar a ortografia. Também é preciso compreender as convenções ortográficas, a origem da palavra, tal como entender que há situações em que a relação entre a letra e o som se processa de maneira irregular. “Letras pronunciadas de forma parecida podem confundir as crianças que estão a aprender a escrever”, avisa. 

Se os erros acontecem então é necessário identificar as causas. Maria Regina Rocha refere que é preciso compreender as razões por que isso acontece: se decorre de uma oralização incorreta, se há confusão entre as diversas grafias de um mesmo som, se há dificuldade na delimitação das palavras, se é recorrente o uso incorreto de determinadas letras, se o erro acontece por dificuldades de natureza morfológica ou sintática, se é a acentuação que está a criar problemas. 

Caixinha da ortografia 
Causas detetadas, insiste-se na forma correta da palavra, na regra, fazem-se exercícios para a sua interiorização. “Dar erros não é fatal”, comenta. Mas é preciso atenção. O contacto com o modelo correto é essencial porque a aquisição de competências na ortografia também se processa pela visualização de palavras. Conhecer as regras, compreendê-las, interiorizar as convenções ortográficas, por exemplo, quando se escreve “e” com o som de “i”, que entre vogais o som “z” escreve-se normalmente com “s”. Tudo é importante para não dar erros. 

Quando se ensina uma palavra nova, o professor pode escrevê-la em letras garrafais numa cartolina ou no quadro. É importante que os alunos a visualizem e ouçam o seu som. Maria Regina Rocha dá mais conselhos. “De dois em dois dias, coloquem na parede da sala uma palavra nova com previsível dificuldade de natureza ortográfica, expliquem o seu significado, escrevam uma frase com essa palavra.” 

Os professores devem fazer uma lista ordenada com os graus de dificuldade dos alunos, explicar uma regra por semana e insistir nela, fornecer às crianças um grande número de palavras, elaborar exercícios para sublinhar palavras - como, por exemplo, enumerar quatro palavras com o mesmo grau de dificuldade, procurar no dicionário e elaborar uma frase com cada uma delas. Ou ainda procurar rimas no dicionário, por exemplo, cinco verbos terminados em “izar” e construir frases.  

Criar uma caixinha da ortografia e colocá-la na sala de aula é uma atividade que pode captar a atenção e eliminar erros nos cadernos. É mais uma sugestão da professora. Uma caixinha com várias palavras, um aluno tira um papel com uma palavra, o professor dita a palavra e se alguém errar, a palavra volta para a caixinha. O objetivo é que a caixa fique vazia. Caixa sem palavras, zero erros nos cadernos. 

Fazer uma lista de erros de cada aluno dá trabalho, mas pode ser bastante útil nesta tarefa de ensinar a escrever. Fazer essa lista e entregá-la aos pais ajuda a remar para o mesmo lado, a congregar esforços. Depois disso, a atuação pode ser cirúrgica, o professor pode elaborar uma bateria de exercícios apenas com essas incorreções e pedir aos alunos que os resolvam.

“Eu não dou erros!” é um livro que ensina regras de ortografia de uma forma clara, apresenta variados exercícios que abrangem muitos assuntos, e que dá resposta à generalidade das dúvidas de ortografia. Como utilizar o “m” e o “n” no final de uma sílaba, quando se usa o “x” e quando é “ch”, o “am” do passado e o “ão” do futuro, o til, a acentuação, são alguns dos assuntos pormenorizados nesta publicação recentemente editada pela Porto Editora e assinada por Maria Regina Rocha e Maria Helena Marques.  

Informação retirada daqui

Diretores de escolas sabem liderar, dizem os docentes


Os professores confiam na capacidade dos diretores de escola para liderar. A conclusão é retirada de um inquérito realizado a mais de 20 mil docentes do ensino público. Mostra como entendem ser a liderança na escola onde ensinam.

Os professores confiam na capacidade de liderar dos seus diretores. Um inquérito realizado a mais de 20 mil docentes do ensino público mostra a visão que têm sobre o perfil de liderança dominante na escola onde lecionam. Para 50,1% dos inquiridos, o diretor da escola tem atitudes e comportamentos de liderança situacional, ou seja, não age sempre da mesma forma mas de acordo com as necessidades do contexto. 29,4% dos inquiridos identificam uma liderança transformacional, em que o líder é capaz de mobilizar e delegar nos liderados. Apenas 9,6% têm a perceção que há uma ausência de liderança.

O que significam estas respostas? “Que, para uma maioria significativa dos respondentes, o estilo de liderança vai variando, ou seja, que não há um estilo de liderança que seja constante.” Mas também que “há um reconhecimento por parte dos liderados de que os seus líderes têm competência, são capazes de os inspirar, de promover o seu desenvolvimento enquanto profissionais e até de os levar a fazer o tal esforço extra”. É o que sustenta Ilídia Cabral, coordenadora do projeto EDUGEST, Gestão Escolar e Melhoria das Escolas, desenvolvido pelo Centro de Estudos em Desenvolvimento Humano da Universidade Católica do Porto, cujos resultados preliminares foram apresentados esta quarta-feira.

Questionada sobre qual a melhor forma de liderar uma organização escolar, Ilídia Cabral esclarece que “existe uma variedade de estilos de liderança nas escolas”. Diz que não é possível apontar um estilo “ótimo”. Mas dá algumas pistas: “Um bom líder tem de ter conhecimento situacional, capacidade adaptativa e flexibilidade para agir da forma mais adequada mediante os contextos”. Por outro lado, acrescenta Ilídia Cabral, “se o objetivo é a melhoria das escolas, o desenvolvimento profissional e da organização, um estilo de liderança mais transformacional, inspirador e empoderador, em que o líder é reconhecido como alguém que age com integridade, é mais promotor de mudanças”.  

É mais fácil identificar o que seria uma má liderança, pois trata-se simplesmente da ausência de liderança, algo que no questionário remetido aos docentes surge designado por “laissez-faire”. A boa notícia é que apenas 9,6% dos inquiridos deixam antever que na escola onde lecionam não há liderança. Significa isto que “o diretor adota uma atitude muito mais passiva, age apenas quando as situações já estão quase irremediavelmente perdidas ou evita agir”, explica Ilídia Cabral, defendendo que “esta ausência de tomada de decisão é muito negativa para a organização”.

Liderança condicionada
Ilídia Cabral não tem dúvidas de que os dados apontam para “uma tendência de confiança do corpo docente nos líderes escolares”. No entanto, reconhece que “o exercício da liderança está muito condicionado por uma série de contingências políticas”, o que, defende a investigadora, deve levar ao questionamento das políticas educativas e da “eterna questão” de dar maior autonomia às escolas. “Até que ponto um diretor de escola pode exercer determinado estilo de liderança se o contexto não o permite?”

“Quando há um reconhecimento por parte dos liderados de que os seus líderes têm competência, são capazes de inspirar e até levar ao tal esforço extra e ao desenvolvimento profissional, isto só pode significar que temos de dar mais autonomia real aos diretores, porque eles são reconhecidos como sendo capazes.”

A equipa de investigadores do projeto EDUGEST descobriu que um dos entraves à liderança transformacional são os mega-agrupamentos, onde existe um menor contacto dos respondentes com as práticas do diretor e, talvez por isso, uma perceção menos nítida do seu papel. Algo que, explica Ilídia Cabral, “acaba por ser compreensível se pensarmos que a presença de um diretor num agrupamento de escolas com cinco ou mais unidades orgânicas não pode ser a mesma do que quando está a gerir uma única escola. Não pode haver a mesma cumplicidade”.

Apesar do cenário construído com base nas respostas dos professores ser otimista, Ilídia Cabral afirma que “ainda há margem para melhorias”. A liderança não pode andar desligada da gestão, recorda a investigadora, defendendo que muito pode ainda ser feito ao nível da formação para o desempenho de cargos de direção. “É preciso identificar os obstáculos concretos com que os diretores se deparam para poder articular um bom modelo de formação - com suporte teórico sólido, mas virado para a prática e para as situações do dia a dia - que permita desenvolver a capacidade de uma liderança situacional.”

Algumas das variáveis que os investigadores consideraram na análise dos questionários, como a região onde lecionam, os anos de serviço, as habilitações académicas e o género dos inquiridos, mostram diferenças na perceção que os professores têm dos estilos de liderança. Alguns exemplos, dizem respeito às diferenças norte e sul. Assim, os professores do norte tendem a ter uma visão dos diretores como sendo mais transformacionais. Mas, à medida que caminhamos para sul, isso deixa de ser tão visível. Isto porque aumenta a frequência de comportamentos cotados como “laissez-faire”.

Os professores com mais anos de profissão e de “casa” não percecionam os seus diretores como sendo tão transformacionais como percecionam os colegas mais novos na profissão ou na escola. Ilídia Cabral admite que a explicação para este resultado possa estar no ciclo de vida profissional ou no perfil do diretor: “Sabemos que há picos de entusiasmo e de entrega à profissão, mas também pode haver da parte do diretor uma preocupação intencional de inspirar os mais novos, até por uma questão de acolhimento de quem chega à escola”.

Quanto mais elevada é a habilitação dos respondentes mais há a perceção de que os seus líderes são mais passivos e evitativos e menos transformacionais. O resultado, diz a investigadora, pode indicar que os mais habilitados possam estar mais afastados da dinâmica das escolas. “Quem tem mestrado ou doutoramento é muitas vezes percecionado na organização como alguém que pode ameaçar a ordem instituída, o que leva essas pessoas a autoexcluírem-se dos processos que decorrem nas escolas e a ter uma perceção influenciada por causa disso.”  

Em termos de género, as professoras tendem a percecionar os seus líderes como mais inspiracionais do que os professores. E as mulheres diretoras são vistas como sendo mais motivadoras do que os colegas do sexo masculino, que, por sua vez, são identificados como tendo mais frequentemente comportamentos passivos.

Ilídia Cabral alerta, no entanto, que algumas das explicações avançadas para os resultados obtidos “não se tratam de hipóteses testadas”. Os investigadores obtiveram 20 631 respostas, representativas de 18,82% do universo de professores do continente. Foram inquiridos através de um questionário enviado por email pela Direção-Geral de Administração Escolar (DGAE). O estudo financiado pelo EDULOG - Think Tank da Educação, da Fundação Belmiro de Azevedo, tem duração de três anos e prevê também, neste ano letivo, uma recolha qualitativa de dados junto das escolas, através da reconstrução das histórias de vida dos diretores.

Informação retirada daqui



“É importante treinar a criança a ficar na tarefa, a colocar nela mais esforço e investimento”


Ana Salgado, psicóloga e especialista em Psicologia da Educação, em entrevista ao EDUCARE.PT, lembra aos pais que a educação se faz também pelo exemplo. E explica como as birras das crianças não as devem fazer perder “oportunidades de aprendizagem”.

O medo da criança fazer uma birra não deve impedir os pais de a levar a um concerto. “O facto de a criança não conseguir autorregular o seu comportamento completamente não deve ser um motivo impeditivo de a tirar de casa. Porque assim se perdem oportunidades de estímulo e de autorregulação.” Diz Ana Salgado, psicóloga e especialista em Psicologia da Educação, numa diversificada entrevista ao EDUCARE.PT, dias depois de ter sido oradora numa palestra sobre autorregulação do comportamento e dificuldades de aprendizagem dirigida a uma vasta audiência de pais e mães. 

Os primeiros anos de vida da criança são os mais difíceis e exigentes. Comportamento e desenvolvimento infantil são questões que preocupam quem tem a árdua tarefa de educar a criança. “Cabe aos adultos – pais, avós, educadores e professores – dar pistas sobre o que a criança pode ou não fazer. Ou seja, fazer uma regulação externa.” Com o passar dos anos, “espera-se que esta regulamentação externa passe a interna”. Mas trata-se de um processo, lembra Ana Salgado, “os marcos nem sempre estão bem definidos e muitas vezes temos adolescentes e adultos ainda a precisarem desta regulação externa”.

“A educação também se faz pelo exemplo”, insiste Ana Salgado. No pré-escolar, surgem as preocupações iniciais com a aquisição de competências. O que podem fazer os pais para criarem “bons alunos”? É assim tão importante pôr as crianças aos três anos a aprender Inglês? “Nos primeiros anos de vida, a criança não precisa mais do que relações positivas, adultos de referência e estímulos diversificados”, tranquiliza a psicóloga.

Mas atenção à superestimulação: “É muito fácil ver crianças com 3 anos que saltam do desenho para a plasticina para os “Legos”, para as bonecas, para o tablet, tudo em 30 minutos. É importante treinar a criança a ficar na tarefa, a colocar nela mais esforço e investimento.”

(E): Como podemos ensinar a criança a controlar o seu comportamento? É pelo exemplo?
Ana Salgado (AS): As crianças quando nascem têm os seus níveis de consciência menos desenvolvidos. A consciência social do que é uma norma, uma regra ou uma expectativa varia com a cultura e o contexto onde crescem, mas vai sendo desenvolvida ao longo dos primeiros anos de vida. Significa que no início a criança terá mais dificuldade em controlar o seu comportamento. Cabe aos adultos – pais, avós, educadores e professores – dar pistas sobre o que a criança pode ou não fazer. Ou seja, fazer uma regulação externa.

À medida que o tempo passa, espera-se que esta regulamentação externa passe a interna. Pelo meio, surge a questão de regular pelo exemplo. Como faz o pai? Se no supermercado ajuda a senhora mais idosa a levar as compras, a criança terá esse exemplo de vida e provavelmente vai querer ajudar os outros. Se o pai não grita com a mãe, provavelmente a criança não vai gritar com a mãe, nem com os amigos. A educação também se faz pelo exemplo.

E: Que fatores comportamentais podem afetar as aprendizagens?
AS: Existem fatores de risco e fatores protetores. A investigação tem-nos mostrado que pais com habilitações superiores tendem a conseguir apoiar melhor os seus filhos na escola. Até dar outro tipo de oportunidades em termos de progressão académica. Mas há exceções. Alguns estudiosos também vão dizendo que, nos primeiros anos de vida, a criança não precisa mais do que relações positivas, adultos de referência e estímulos diversificados.

E: Não precisa de oportunidades de aprendizagem?
AS: Os estímulos diversificados já são as oportunidades de aprendizagem. Mas até aos três anos não importa tanto se a mãe da criança tem o 4.º ano de escolaridade ou o doutoramento. Importa sim que a mãe esteja disponível para cuidar, para ser a base segura de vinculação e para ser um adulto de referência que dê confiança, segurança à criança e a estimule. 

E: Até aos três anos os pais não devem estar preocupados que as crianças aprendam os números, as letras ou até Inglês?
AS: Sabemos que, em termos de processamento cognitivo, as crianças são capazes de aprender idiomas. Muitas crianças até conseguem ser bilingues quando têm pais de diferentes nacionalidades. Mas ter crianças a falar um segundo idioma não deve ser, nestas idades, uma preocupação para os pais. Nos primeiros anos, a multiplicidade de experiências é o mais importante. Levar a criança a um concerto ou ouvir um CD em casa. Fazê-la contactar com as artes, a música, o teatro, a dança. Também levá-la ao parque da cidade, à quinta para perceber de onde vêm as maçãs ou colher um tomate.

Esta multiplicidade de experiências, às vezes até muito sensoriais, vai permitir às crianças explorar o que elas são, o mundo e por sua vez também a autorregular o seu comportamento. As crianças vão perceber que em determinados contextos podem sentar-se no chão ou pegar em montes de folhas secas e atirar ao irmão. E noutros contextos têm de fazer silêncio, porque estão num ritual.

E: Há experiências que são desaconselhadas. Não levar a criança a certos sítios para evitar as birras...
AS: Levar uma criança de 4 ou 5 anos um concerto de música clássica é muito exigente em termos de autorregulação. Mas os pais não devem impedir uma criança mais nova de ir ao concerto do irmão mais velho, porque há risco de ela fazer uma birra. O facto de a criança não conseguir autorregular o seu comportamento completamente não deve ser um motivo impeditivo de a tirar de casa. Porque assim se perdem oportunidades de estímulo e de autorregulação.

Não vamos exigir de uma criança de 3 anos o mesmo tipo de comportamento e regulação de um jovem de 15 anos. Os pais podem levar a criança ao concerto, mas vão os dois, para um deles poder sair com a criança em caso de necessidade. Os pais precisam de deixar as crianças testarem-se a si próprias e perceber quais são os limites. Uma queixa frequente dos pais é que as crianças não sabem lidar com a frustração e que perante qualquer obstáculo pensam que o mundo vai acabar. Se estivermos sempre a proteger as crianças, obviamente que estamos a cuidar delas, mas a fazê-lo dentro de uma gaiola.

E: É com experiências destas que a criança aprende?
AS: Se pensarmos no sentido lato de aprendizagem, estamos a aprender quase involuntariamente em qualquer segundo da nossa vida. Os pais vão no carro a ouvir música na rádio, a criança ouve e mesmo que a letra seja em inglês, muitas vezes aprende e consegue cantarolar. O que aconteceu? Uma aprendizagem involuntária. Houve um estímulo, captou a atenção da criança, o input foi processado pelo cérebro, a memória ativou-se e a letra ficou lá. O facto de a aprendizagem poder ser voluntária tem um potencial gigantesco e um risco muito grande, porque temos o reverso da medalha. Mas para a criança aprender não basta ter um ambiente enriquecedor, é preciso motivação.

E: A motivação é uma questão delicada...
AS: Há meninos e meninas em países muito desfavorecidos que não têm os estímulos, nem o ambiente enriquecedor que têm as nossas crianças, mas estão tão motivados para aprender que fazem quilómetros a pé para irem à escola. No oposto temos a nossa realidade, superestimulante, com todo o tipo de brinquedos de diferentes categorias e meninos e meninas sem motivação para aprender. Temos cada vez mais crianças com défices de atenção provavelmente ligados ao facto de serem superestimulados.

É muito fácil ver crianças com 3 anos que saltam do desenho para a plasticina para os “Legos”, para as bonecas, para o tablet tudo em 30 minutos. Depois, os pais pensam que a criança é muito ativa e curiosa. Até pode ser! Mas também é importante treinar a criança a ficar na tarefa, a colocar nela mais esforço e investimento. 

E: Como é que os pais podem fazer isso?
AS: A criança começa um desenho e o pai ou a mãe podem observar e fazer perguntas como o que estás a desenhar? A criança responde uma flor. Os pais contrapõem: a quem vais dar essa flor? A criança responde a uma menina. Os pais dizem para a criança desenhar a menina. E continuam as perguntas: onde mora a menina? A criança diz que mora numa casa. Os pais pedem para a criança desenhar a casa. Assim por diante.

Ou seja, levar a criança a investir na tarefa. De modo que aquele desenho não demore apenas 5 minutos a ser feito, mas demore 30 minutos. Isto também é prepará-la para o contexto escolar. Porque na escola a professora vai pedir tarefas não de 5 minutos, mas de 30 minutos. E como a criança não está habituada a estar tanto tempo a fazer uma tarefa, não vai gostar. Até porque é mais estimulante saltar de tarefa em tarefa. Mas vai ter de fazer o que a professora pede. E depois, surge a desmotivação ou a hiperatividade.

E: Quer dizer que a criança reage mal à diminuição de estímulos a que está sujeita na escola?
AS: É um problema da nossa sociedade. Há um diferencial gigantesco entre o que as crianças têm em casa, em termos de estímulos e possibilidades, e o que existe na escola. Continuamos a ter uma escola com um quadro negro, uma professora que fala, uma turma que escreve e uma carteira onde a criança está sentada ao lado da colega. Temos uma escola que não é tão estimulante quanto estar em casa.

Em algumas situações, as crianças acabam por aprender mais em casa com o tablet e o computador do que na escola. Aprendem ao ritmo delas, aprendem o que querem e quando querem. Este é um grande desafio colocado às nossas escolas e aos professores. Como respeito o ritmo de aprendizagem da criança? Como a motivo? Como torno a minha aula mais dinâmica? Como diferencio os níveis de conhecimento dentro da sala de aula?

E: Mas há exemplos de boas práticas nas escolas em torno de todas essas questões.
AS: Temos escolas com projetos inovadores e professores que se implicam muito. Há uma escola que já percebeu que é preciso fazer um mobiliário diferente para possibilitar que os alunos estejam em pé enquanto fazem algumas tarefas. Algo que, em termos de motricidade motora, respeita mais as necessidades daquelas crianças. Há outra escola que está a apostar nos quadros interativos, porque se apercebeu do potencial enorme da tecnologia. Outra escola faz intervalos a horas diferentes, porque testou e percebeu que essa mudança era importante. Há escolas a trabalharem em <i>problem-based learning</i> ou com metodologias de projetos. Claro que existem bons exemplos! Só não estamos a ser capazes de congregar todas as boas práticas numa sala de aula.

Informação retirada daqui

O que querem as crianças do pré-escolar?


Deixaram de pedir colo a toda a hora, começaram a gatinhar, atreveram-se a caminhar, a saltar, a correr, e agora fazem perguntas atrás de perguntas porque querem saber e descobrir, querem perceber como funciona tudo o que existe à volta. Estão a crescer e as brincadeiras fazem parte da compreensão do mundo, do desenvolvimento, da curiosidade e da imaginação, das competências emocionais e sociais. As crianças em idade pré-escolar, dos três aos cinco anos, querem brincar, jogar, aprender, mexer, perguntar, explorar. E voltar a brincar. Com os pais sempre por perto.

“As crianças precisam de ter muito tempo para brincar. Brincar é a atividade mais importante para elas nestas idades”, explica Teresa Sarmento, doutorada em Estudos da Criança, professora do Instituto de Educação da Universidade do Minho, em Braga, com vários projetos e publicações na área da educação de infância. Tudo é importante nesta etapa da vida em que aprendem uns com os outros e com os adultos, com curiosidade, desenvolvendo a linguagem e os aspetos cognitivos e emocionais.

Brincar livremente deve ser uma ideia feliz e arejada. Teresa Sarmento refere que “há uma grande intromissão dos pais nas brincadeiras, na perspetiva de superproteção”. “As crianças precisam de se confrontar com desafios para serem capazes de experimentar formas de resolverem conflitos”, sublinha. Essa superproteção não ajuda na aprendizagem, no crescimento, no desenvolvimento. Incentivar a curiosidade e a imaginação é essencial, naturalmente em contextos seguros e protegidos de condições adversas.

Brincar é um mundo de infinitas possibilidades. Brincar com objetos, com materiais não estruturados, flexíveis, que permitam dar asas à imaginação. Saltar, correr, mexer o corpo. Ouvir uma história, abrir livros, ser a personagem de que mais se gosta. Fazer de conta, imaginar, sonhar. Assimilar o que existe à volta. Saltar à corda e ao elástico. Jogar à bola. Usar as novas tecnologias para brincar e aprender. Jogar em tabuleiros, jogar no computador, explorar conhecimentos no mundo digital com vídeos e mil e uma coisas sobre o próprio mundo. Sair de casa para passeios ao ar livre, assistir a um filme de animação. Conversar, perguntar, esclarecer.

“Entre os três e os cinco anos, as brincadeiras devem ter algumas componentes-base: conexão, diversão e exploração”, adianta Joana Laranjeiro (Mãe Catita), autora e coach parental. Há tanta coisa que pode ser feita. “Criar exercícios curtos onde a criança se sente desafiada a ampliar a sua curiosidade e capacidades, e em que se sente vista pelo olhar presente dos pais. Brincadeiras em que os objetivos são claros e a tarefa adequada à idade. Apostar na concretização e não na frustração. Misturar música, a utilização do corpo e, sempre que possível, contacto com a natureza. Deixar a criança liderar e inventar algumas brincadeiras”, aconselha.

Brincar nunca deve ser um assunto menor. “Deixar a criança ensinar aos pais algo que aprendeu é extremamente poderoso para a autoestima.” “Nesta idade, já é possível trabalhar as emoções com a criança, perguntando como se sentiu quando ganhou o jogo, ou quando perdeu. E em que parte do corpo sente a emoção com mais intensidade”, adianta Joana Laranjeiro.

A idade pré-escolar é também um precioso momento para trabalhar competências em várias áreas. Joana Laranjeiro lembra as palavras de Stuart Brown, fundador do National Institute for Play, que reforça a importância do brincar como um minilaboratório de aprendizagem. “E é uma excelente oportunidade para fortalecer a nossa relação com os nossos filhos. A relação é a base de uma infância feliz”.

https://www.educare.pt/noticias/noticia/ver/?id=158906&langid=1

Devem os pais estudar com os filhos?


Nem com os filhos, nem pelos filhos, alertam os especialistas. É aconselhável que haja supervisão e acompanhamento por parte dos adultos, sobretudo nas mudanças de ciclo. Mas o objetivo deve ser sempre fomentar a autonomia, a responsabilidade e a independência.

Não é raro encontrar pais que estudam com os filhos: leem textos, ajudam na interpretação e nas contas, sugerem correções, fazem os resumos. Apesar de as intenções serem as melhores, esta é uma prática que tem consequências a vários níveis do desenvolvimento das crianças e adolescentes. “A melhor ajuda é a não ajuda. Se estudam com ou pelos filhos, começam a pôr em causa a construção de autonomia que os miúdos têm que ter”, diz o psicopedagogo Renato Paiva.

Ler um texto, interpretá-lo, produzir respostas e uma reflexão são tarefas que dão trabalho. “Quando os pais estudam pelos filhos, passamos a ter miúdos que têm pouco traquejo em pensar sobre o que estão a aprender e a ter pensamento crítico, porque a maior parte desse trabalho é feito pelos pais”, explica o diretor da Clínica da Educação, onde costuma receber “muitos casos” relacionados com esta questão. “Não são excecionais. São frequentes”, garante.

Por vezes, adianta Renato Paiva, esse apoio coloca as crianças numa posição “mais passiva” e há mesmo uma invasão da relação pai-filho ou mãe-filho. “Os pais sentem que os filhos deviam fazer e não fazem, e há chatices porque os filhos estão dependentes dos pais, que nem sempre podem porque não se lembram da matéria ou não têm tempo. E caem mesmo no erro de estudar a matéria para poder ajudar os filhos”, indica.

Fazer os resumos para os testes ou ajudar nos trabalhos de casa é como mastigar a comida antes de a dar a uma criança. A comparação é feita por Jorge Rio Cardoso, professor universitário, que se tem dedicado a combater o insucesso escolar. “É preciso fomentar a criação de hábitos de trabalho, a autonomia e a organização, que levem a uma aprendizagem de forma autónoma. No primeiro ciclo e na passagem para o segundo, pode haver alguma ajuda, mas ao nível dos métodos de estudo”, afirma o autor de livros como o “Guia para seres o melhor aluno”.

Para Rio Cardoso, os pais não devem estudar Ciências ou Matemática com os filhos, mas podem dar-lhes dicas sobre a melhor maneira de fazer apontamentos, como se organiza o tempo, como se estrutura uma resposta, como podem melhorar a letra. Não mais do que isso. “Um dos problemas é que os pais lembram-se como a matéria foi dada há 20 anos ou mais, mas agora é trabalhada de outra forma. Isso pode criar confusões”.

Para diminuir a insegurança, o docente universitário sugere “cidadania familiar”, ou seja, “os pais podem estar ao pé da criança, a fazer uma atividade que não seja muito atrativa, para que não haja distrações”. E, aos poucos, “ir retirando esses apoios”. Defende a “gradualidade”. E, se tiverem de ajudar uma vez, “não há grande mal”. “Não somos super pais”, refere Jorge Rio Cardoso, apelando ao “bom senso”.

Já Renato Paiva, diz que o melhor é sempre “delegar para quem de direito”. Na sua opinião, é melhor os adultos “fingirem que não se lembram e encaminharem para o professor”. Até porque, alerta, “nem sempre as explicações dos pais são as melhores e mais corretas”. Mas o assunto não deve ficar esquecido. No dia seguinte, sugere, devem perguntar à criança se esclareceu a dúvida com o professor.

A dependência agrava-se
Segundo os especialistas, a dependência dos estudantes tende a perdurar no tempo e até a agravar-se. “A complexidade das matérias vai aumentando e os meninos do 7.º, 8.º e 9.º que estavam habituados a que os pais estudassem com eles, vão ter mais dificuldade em estudar de forma autónoma numa fase mais tardia do que se a autonomia for promovida numa fase mais precoce”, declara Renato Paiva.

Os pedidos de ajuda costumam chegar ao psicopedagogo por volta do 7.º ou 8.º ano. Como a complexidade dos conteúdos aumenta, os pais deixam de conseguir acompanhar com “o nível de profundidade e exigência” que é pedido. “Sentem-se maus pais por retirarem uma ajuda da qual os filhos necessitam, mas foram eles que a promoveram e protelaram”, lembra. Para os educadores, tende a ser muito “angustiante tirar-lhes uma coisa que os vai deixar desamparados e inquietos”. Mas isto, frisa, “é consequência de um erro”.

Afinal, o que leva alguns pais a empenharem-se tanto no estudo dos filhos, ao ponto de lhes fazerem os trabalhos de casa e os resumos para os testes? “É com a melhor das intenções”, diz Rio Cardoso, acrescentando que, no secundário, por exemplo, “é porque querem muito que os filhos entrem em Medicina ou no Técnico”. Não raras vezes, “querem obsessivamente que eles estudem e tenham boas notas, mas depois eles não são felizes”.

Para Renato Paiva, existem três explicações: facilidade, exigência e proteção. “Numa fase mais precoce, os filhos pedem ajuda porque é mais fácil e mais rápido, e os pais têm tendência para aliviar a tarefa”, explica. Outra justificação prende-se com a exigência que colocam nos resultados académicos. “Sentem que, se não ajudarem, os miúdos não conseguem atingir os resultados que eles esperam”. E, por fim, há crianças com mais dificuldades, pelo que os pais assumem esse papel como uma medida de proteção. Mas “isso é uma minoria”, porque os alunos com mais dificuldades são aqueles que “têm hábitos de trabalho mais enraizados”.

A regra é não estudar “com e pelos filhos”, mas é muito importante que haja supervisão e acompanhamento, destaca Jorge Rio Cardoso. “Deve haver um grande envolvimento em termos afetivos, dizer ‘eu estou aqui’, valorizar a escola. Só vão investir tempo e atenção numa coisa se sentirem que os pais acreditam nela”. Como diz o velho ditado, lembra: “Em vez de dar o peixe, ensina-o a pescar”.

https://www.educare.pt/noticias/noticia/ver/?id=163578&langid=1

Um quarto dos professores optou por fazer revisões da matéria


Inquérito da Universidade Nova de Lisboa revela que apenas um terço dos professores fez testes no 3.º período, que mais de metade deu matéria nova, e que a maioria teve em conta os trabalhos de casa para a avaliação final. O questionário mostra ainda que 15% dos alunos não têm computador ou acesso à Internet em casa.

Durante o 3.º período, com a maioria dos alunos em regime de ensino à distância, 33,7% dos professores fizeram testes e 84,1% tiveram em conta os trabalhos de casa para a avaliação final do ano letivo. Estes são alguns dos resultados de um inquérito feito a 2 647 docentes de todo o país, do pré-escolar ao Ensino Secundário, durante o mês de maio, pelo Centro de Economia da Educação da Universidade Nova de Lisboa.

No último período de aulas, 26,3% dos professores, cerca de um quarto da amostra, optaram por fazer revisões da matéria dada e a maioria, 68,1%, lecionou novos conteúdos do programa à distância. Na avaliação final, além dos testes realizados e dos trabalhos de casa enviados, a assiduidade e a participação nas aulas também pesaram para as notas. Ao todo, 67,7% dos inquiridos referiram valorizar a assiduidade e 64,8% a participação dos alunos.

O inquérito revela ainda que 73% dos alunos enviaram sempre os trabalhos solicitados pelos seus professores. E, por outro lado, que 15% dos estudantes não têm computador ou acesso à Internet em casa e que 24% dos professores enviaram material em papel aos seus alunos. No inquérito promovido pela Federação Nacional dos Professores (FENPROF), verificou-se que 54,8%, dos 3 548 docentes inquiridos, garantiam que não tinham conseguido contactar todos os alunos a meio do 3.º período.

“Houve quem tenha trabalhado e aprendido e outros em que isso aconteceu muito pouco”, referiu Ana Balcão Reis, diretora científica do centro da Universidade Nova, em declarações ao Jornal de Notícias (JN). Em seu entender, o ensino à distância agravou as desigualdades e o último período do ano letivo decorreu com enormes disparidades, com grandes diferenças inclusive entre turmas do mesmo agrupamento. As condições das famílias foram determinantes. Para Ana Balcão Reis, não será possível recuperar tudo o que ficou para trás e serão necessários mais apoios individualizados no próximo ano letivo.

Ao Observador, Ana Balcão Reis disse que a falta de computadores entre os alunos foi mais uma confirmação do que uma surpresa. “A grande surpresa foi perceber como é que estas aulas à distância estão a acontecer. Quando olhamos para estes resultados preliminares e vemos que só 30% dos professores recorrem à videoconferência percebemos que o ensino online não é nada online”, afirmou ao jornal digital.

Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) indicam que cerca de 50 mil alunos não terão computador nem acesso à Internet em casa. No ano passado, segundo o INE, 80,9% dos agregados familiares tinham acesso à Internet em casa e nas famílias com filhos até aos 15 anos a percentagem subia para 94,5%. Feitas as contas, mais de 5% dos alunos com menos de 15 anos viviam em casas sem ligação à Internet.

O 3.º período começou com ensino à distância para todos os alunos, entretanto os do 11.º e 12.º anos regressaram às escolas em meados de maio. Os constrangimentos foram evidentes e constantemente referidos em vários discursos de responsáveis escolares, dirigentes sindicais, comunidade educativa. Alunos sem forma de contactarem com os seus professores, trabalhos enviados pelo correio, dificuldades de comunicação, pais e avós em telefonemas aos diretores de turma, escolas a funcionar a diferentes velocidades.

A SIC, por exemplo, acaba de noticiar que os alunos da EB2,3 Luís de Camões, no centro de Lisboa, não tiveram aulas online desde que foi declarado o estado de emergência. A direção do estabelecimento de ensino decidiu que a comunicação seria feita por e-mail. Depois de várias queixas dos encarregados de educação, a associação de pais questionou a direção da escola que garante ter cumprido com as orientações da tutela. À SIC, o Ministério da Educação (ME) anunciou que vai analisar o caso.

O ME recebeu uma carta aberta de um grupo de pais, encarregados de educação, movimentos e sindicatos, que pede um Programa Nacional de Transformação Digital na Educação, ou seja, o acesso universal às tecnologias de informação e Internet e um combate efetivo à iliteracia digital. As disparidades são referidas nesse documento. “Se no Agrupamento de Escolas da Portela e Moscavide, em Loures, a percentagem de alunos sem acesso a computador é pouco superior a 10%, já na EB2,3 do Viso, no Porto, o número sobe para 25%. Estes valores sobem a pique para os 75% no Agrupamento de Escolas do Catujal-Unhos, em Loures, e superam os 90% no Agrupamento de Escolas da Trafaria, em Almada”, lê-se na carta.

As diversas e distintas realidades vividas pelos agrupamentos escolares são assim colocadas a descoberto e revelam desigualdades sociais que preocupam. “Estas desigualdades limitam o acesso universal à Educação prevista na Constituição da República Portuguesa e impedem que parte dos alunos consiga acompanhar as atividades letivas quando as aulas presenciais não são possíveis”, lembram os signatários da carta que tem como primeiro subescritor André Julião, presidente do MESA – Movimento Escolas Sem Amianto.

A mais baixa proporção do ensino público situa-se no pré-escolar

Em Portugal, a maioria das crianças e dos jovens continua a estudar no setor público. O Anuário Estatístico de Portugal 2019 do Instituto Nacional de Estatística (INE), mostra alguns indicadores sobre o setor da educação em Portugal. O EDUCARE.PT faz uma síntese dessa informação.

O Instituto Nacional de Estatísticas dá a conhecer alguns detalhes do sistema educativo em Portugal. Através dos números ficamos a saber quantos alunos estudam no ensino público, como se distribuem os professores pelos diferentes níveis de ensino e qual o investimento do Estado em Educação. O EDUCARE.PT passou em revista a informação sobre o setor da educação coletada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) no Anuário Estatístico de Portugal 2019.

Em 2017/2018, o ano letivo de referência das estatísticas relacionadas com o setor da educação, contavam-se 1,6 milhões de alunos matriculados no ensino não superior, ou seja do pré-escolar ao secundário. A distribuição pelos diferentes níveis de escolaridade fazia-se assim: 240 231 alunos no pré-escolar, 987 704 no ensino básico ( 1.°, 2.° e 3.° ciclos), 401 050 no ensino secundário e 4 741 no ensino pós-secundário não superior.

Separando ensino público e privado, os dados do INE mostram que ensino público mantém a preponderância nos diversos níveis de educação no que toca ao número de alunos matriculados. Do pré-escolar até ao ensino secundário, 80,1% do total de alunos a estudar em Portugal fá-lo na escola pública. A rede de ensino público abarca 72,5% do total dos estabelecimentos de ensino e emprega 86,4% do pessoal docente.

Num cenário em que a frequência do ensino público prevalece, de forma clara, sobre o privado há apenas uma exceção. O pré-escolar público representa a mais baixa proporção de ensino público: 53,1%. “Não se afastando muito da linha média da década”, refere a 111.ª edição do anuário do INE.

Ainda no pré-escolar, o ano letivo de 2017/2018 caracterizou-se por uma diminuição de 5,4% do número de crianças matriculadas. Acompanhada também por uma diminuição de 0,5% do pessoal docente. Isto, relativamente ao ano de 2016/2017. Também o ensino básico registou uma diminuição do número de alunos matriculados no 1.°, 2.° e 3.° ciclo, na ordem dos 0,6%, 2,5% e 1,1%, respetivamente. Contra a corrente, no ensino secundário observou-se um aumento de 0,3% no número de matriculados comparativamente ao ano letivo anterior.

De modo geral, há ainda mais professores no sistema educativo português. De acordo com os dados do anuário, o pessoal docente aumentou 0,4% no 1.º e 2.º ciclos do ensino básico e 1,5% no 3.º ciclo e ensino secundário.

Recuando à década de 90, o Anuário Estatístico de Portugal 2019 mostra grandes mudanças quanto ao número de alunos a frequentar o sistema educativo. Comparativamente ao ano letivo de 1990/1991 o número de alunos matriculados aumentou 40% no pré-escolar e 15,3% no ensino secundário. Já no ensino básico diminuiu nos três ciclos: 40%, 38,2% e 20,1% para os 1.°, 2.° e 3.° ciclos, respetivamente.

Mudanças que também se refletiram no corpo docente. Assim, o pessoal docente do pré-escolar aumentou 71,7%, enquanto o do 3.° ciclo e secundário aumentou apenas 18,9% e o do 1.° e 2.° ciclos diminuiu 26,9% e 23%.

Contas feitas pelo INE, existem 146 830 docentes do ensino não superior distribuídos deste modo: 16 065 no ensino pré-escolar, 29 979 no 1.° ciclo, 24 064 no 2.° ciclo, 76 722 no 3.° ciclo e secundário.

O anuário mostra ainda que em 2017/2018, a taxa de retenção e desistência no ensino básico era de 5,1% e a taxa de transição/conclusão no ensino secundário era de 86,1%.

Olhando para os números do ensino superior, dados mais recentes apontam para 385,2 mil alunos inscritos no ano letivo de 2018/2019, mas por questões de coerência com os restantes indicadores o INE considera no anuário os dados de 2017/2018.

Assim, nesse ano letivo inscreveram-se 372,8 mil estudantes nas 290 instituições existentes. Isto significa mais 3% de inscritos do que no ano letivo anterior, a maioria nas universidades e politécnicos públicos (82,8%).

A taxa de escolarização no ensino superior situou-se nos 35,6%, representando um aumento de 1,3 pontos percentuais em relação a 2016/2017. Sendo que as mulheres representam 53,8% do total de inscritos. Comparando 2018/2019 ao ano letivo de 1990/1991, o número de inscritos praticamente duplicou, tendo aumentando 99,6%.

Quem terminou o curso? O INE contabiliza 79,8 mil alunos diplomados no ano letivo 2017/2018. Ora, um aumento de 3,7% em relação ao ano anterior. As áreas de estudo com maior número de diplomados foram as "ciências empresariais, administração e direito" contabilizando 20,3% do total, a "engenharia, indústrias transformadoras e construção" com 19,6% e a "saúde e proteção social" com 17,5%.

O INE refere ainda que o Estado investiu no setor da educação 4,5% do produto interno bruto (PIB) em 2018 e que a despesa pública em Educação foi de 9 266 milhões de euros.

Estes são alguns dos números que constam do Anuário Estatístico de Portugal 2019, divulgado em julho pelo INE e que reúne não apenas informação sobre educação, mas sobre cultura, rendimento, condições de vida e mercado de trabalho.

Andreia Lobo

https://www.educare.pt/noticias/noticia/ver/?id=175206&langid=1

Forest School: escolas na floresta, salas sem paredes, crianças lá fora

O conceito surgiu na Escandinávia em meados do século passado. A ideia ganhou raízes e seguidores que acreditam que há tanto para explorar e aprender em contacto com a natureza. Portugal tem alguns exemplos e 20 de maio é Dia de Aulas ao Ar Livre. Dia para correr, saltar, brincar, subir às árvores, respirar ar puro.    

A metodologia condiz com o conceito, nascido nos anos 50 do século XX na Escandinávia, de levar as crianças para o campo, para a floresta. Aprendizagens a céu aberto em contacto permanente com a natureza, sem esquecer a individualidade de cada ser e a importância de brincar. Sem descurar a descoberta, a observação, a partilha, a colaboração. A Forest School surgiu num ambiente natural para que as crianças assumam riscos, desenvolvam atitudes positivas, e se tornem adultos confiantes, independentes, ativos. As componentes sociais, emocionais e físicas são valorizadas todos os dias. 

A Escola Lá Fora desenvolve os seus projetos Forest School desde o ano passado com um conjunto de iniciativas de aprendizagem e lazer ao ar livre de forma a reforçar a ligação das crianças com a natureza. O respeito pela individualidade e pelas características de cada criança é um dos seus princípios, bem como o respeito pelo tempo de desenvolvimento natural de cada uma. As aprendizagens acontecem na cooperação e ligação com os outros e fora de portas, na zona florestal da Quinta das Conchas, em Lisboa. 

Ana Passos e Sousa, diretora técnica da Escola Lá Fora, psicóloga, com experiência na gestão e implementação de modelos pedagógicos em creches e jardins de infância, explica o que move o projeto. “Baseamo-nos no modelo Forest School, em que há uma exploração do meio natural, um grande respeito pela individualidade de cada criança – a criança como única com características muito específicas - que é importante respeitar”, refere. Uma aprendizagem ativa numa mata que as crianças conhecem e andam à vontade. 

É um espaço ao ar livre como uma sala sem paredes que permite um sem-fim de atividades, além de pinturas, colagens e recortes. “Fazemos muitas atividades de transformação de materiais naturais, folhas, paus, pedras, uma diversidade enorme. Há muita margem para trabalhar criativamente e na resolução de problemas”, adianta Ana Passos e Sousa. “Há muitos desafios motores pelo contexto natural, mas também construído por nós”, acrescenta.

A descrição das atividades tem espaço nas redes sociais. “Com as pás, escavámos uns buracos na terra. Juntámos água. Primeiro, batemos com as botas, depois as pernas. Depois, o resto. É um bocadinho como quando ouvimos uma música de que gostamos e não conseguimos ficar quietos. De repente, éramos todos iguais, criaturas de lama”. “Temos uma biblioteca lá fora que não tem paredes. Às vezes está numa lona à nossa espera, outras sobre rodas, num carrinho (…). Podemos consultá-la ou pedir que a leiam e não há limite: pode ser para um, para dois, ou para todos”. Há também sestas lá fora com o som dos passarinhos e os ramos das árvores a balançar. 

O planeamento das atividades é definido com as crianças. “O que dá margem para tudo e mais alguma coisa”, diz a diretora técnica. A Escola Lá Fora tem pré-escolar para crianças dos três aos seis anos, a meio tempo e tempo inteiro, como um jardim de infância que funciona no exterior, e ainda atividades extracurriculares, de final de tarde, para alunos até aos 12 anos. O playgroup para bebés dos zero aos três anos, acompanhados por um cuidador, foi suspenso devido ao contexto de pandemia, e será retomado em setembro. E há ainda campos de férias. 

Ana Passos e Sousa e Ana Galvão, diretora pedagógica da Escola Lá Fora, consideram que este movimento de aprendizagens ao ar livre devia ser a regra e não a exceção e defendem “uma revisão legislativa para se enquadrar as sessões educativas ao ar livre”. “É um caminho que está a começar”, repara Ana Passos e Sousa. “Este tipo de modelo não devia ser reservado a uma elite que consegue pagar uma escola privada, devia ser mais regular e acessível a todos. Devíamos levar este modelo ao maior número de crianças possível”, sublinha.  

A Escola da Floresta do Movimento Bloom, associação ambiental sem fins lucrativos, quer reconectar as crianças à natureza através de experiências emocionais e divertidas, através do brincar. É um processo inspirador e uma pedagogia que permite um contacto permanente com o meio exterior e trabalha competências sociais e emocionais, o pensamento criativo, a comunicação, a resiliência, a resolução de problemas. 

É uma escola que tem por base a filosofia Forest School e implementa atividades da Sharing Nature Worldwide, através da metodologia lúdico-criativa Flow Learning centrada em despertar o entusiasmo, experiência direta, focar a atenção, partilhar a inspiração. A Escola da Floresta Bloom surgiu em 2018, depois de uma candidatura a uma bolsa da Gulbenkian, com 16 turmas do 1.º Ciclo da Escola Básica da Várzea, em Sintra. A Quintinha de Monserrate, em Sintra, é a escola.   

Mónica Franco trabalha com crianças e com escolas há vários anos, é coordenadora da Escola da Floresta e uma das fundadoras do Movimento Bloom. “Sentimos que as crianças estão cada vez mais desligadas da natureza e têm o seu tempo estruturado pelos adultos”, constata. E assim surgiu esta oferta que privilegia atividades ao ar livre, contacto com a natureza, construção de abrigos, jogos sensoriais e criativos, arte com objetos que o meio exterior oferece. Tudo de uma forma orgânica e natural. 

“A natureza é a melhor sala de aula possível”, garante Mónica Franco. Não há um currículo definido e fechado para crianças do pré-escolar e 180 alunos do 1.º Ciclo de 10 escolas de Sintra. Por cada cinco, seis crianças, há um adulto, para que os mais novos corram, saltem, explorem a natureza, corram riscos, descubram, aprendam. “É um acompanhamento para apoiar e sustentar a aprendizagem”. As crianças são protagonistas do que aprendem. 

Vinte de maio é o Dia de Aulas ao Ar Livre. Todas as escolas, de todos os níveis de ensino, Superior incluído, podem dedicar algumas horas ou o dia inteiro a atividades no exterior, em contacto com a natureza. O Movimento Bloom está na organização da iniciativa, juntamente com mais 13 países, e já há mais de 38 mil crianças e jovens inscritos. É um dia para levar as turmas para o recreio ou para a floresta, para uma mata ou bosque, para atividades lúdicas. Há várias dicas no site deste movimento global que trabalha todo o ano para que os mais novos passem mais tempo ao ar livre a aprender, a explorar, a aproveitar o tanto que o mundo natural tem para dar. Carlos Neto, professor catedrático e investigador na Faculdade de Motricidade Humana, autor do livro Libertem as crianças. A urgência de brincar e ser ativo, é o embaixador do Dia de Aulas ao Ar Livre em Portugal.

Cátia Lopes deu aulas em Portugal durante cinco anos, licenciada em 1.º Ciclo do Ensino Básico e pós-graduada em Ensino Especial, há nove partiu para Inglaterra, passou por inúmeras escolas com os mais diversos métodos de ensino, e há ano e meio cofundou uma escola na floresta. Chama-se Being Free Being Me para crianças entre os dois e os cinco anos e fica no sudeste de Londres. É um projeto educacional e democrático ao ar livre focado “na autoaprendizagem e na criação de relacionamentos positivos e de respeito mútuo”. Cátia Lopes prepara-se para voltar para Portugal, previsivelmente ainda durante este ano, para criar uma escola na floresta em Ourém, sua terra natal. Agora, à distância, dá formação a educadores e professores portugueses e interessados no modelo Forest School. 

A lista de vantagens deste modelo é extensa. “É enorme e as pessoas não têm noção”, comenta. Cátia Lopes fala do desenvolvimento emocional – e lembra que a semana dedicada à saúde mental no Reino Unido tem como foco a natureza -, destaca a parte motora e os ganhos em termos de motricidade grossa e fina também. “O facto de subirem árvores, correrem, terem os pés na terra, apanharem chuva”. Combate-se a obesidade e desenvolve-se a linguagem, o vocabulário. “As crianças que passam muito tempo no exterior desenvolvem a curiosidade natural”. 

Reconectar crianças e adultos com a natureza e pensar na educação e na parentalidade de uma forma mais consciente e positiva. Estes são alguns dos objetivos do seu projeto escola na floresta. Cátia Lopes explica, no seu site, o que acontece. “As crianças decidem o que querem aprender e nós proporcionamos um ambiente seguro onde elas se conectam com outras crianças e adultos para partilhar, negociar, resolver problemas e aprender novas competências. As nossas atividades planeadas são flexíveis no sentido em que acomodam os desejos e as ideias dos mais novos”. 

Em 2017, surgiu a Associação Escola da Floresta – Forest School Portugal para estimular e alimentar a abordagem desse movimento. Formação, cooperação em rede e disseminação são os três grandes pilares desta estrutura que defende o programa de educação ao ar livre, no sentido de reaproximar as crianças da natureza e devolver-lhes uma “forma de vida mais harmoniosa e em contacto com o mundo que as rodeia”. É uma forma de estar, é uma filosofia de vida. 

Mais recentemente, em março deste ano, surgiu o Movimento de Aprendizagem ao Ar Livre (AAL) e seu manifesto. Um movimento composto por profissionais de educação, especialistas em desenvolvimento na infância e famílias, que defende a autonomia no contexto educativo, mais oportunidades de as crianças estarem ao ar livre. Um movimento que pretende que o atual paradigma da educação seja alterado para derrubar barreiras ao desenvolvimento físico e emocional dos mais novos. Ana Passos e Sousa, Ana Galvão e Cátia Lopes fazem parte do movimento e assinam o manifesto. Carlos Neto também. 

As crianças já não vão a pé ou sozinhas para a escola, as crianças já não brincam na rua, e as estruturas familiares sofreram mudanças profundas. “Está na altura de, em Portugal, tornar acessíveis a todas as crianças respostas educativas mais diversificadas, que desenvolvam as atividades pedagógicas e curriculares ao ar livre, viabilizando que estas sejam consideradas serviços educativos formais pelo Ministério da Educação”, lê-se no manifesto. Há bastante literatura científica e dados que comprovam os benefícios do contacto com o exterior, impactos no bem-estar e desenvolvimento físico, cognitivo e emocional dos mais novos, nas competências e capacidades inatas de experimentar e cooperar, na exploração e conhecimento do mundo à volta. 

A resiliência, a colaboração, a resolução de conflitos, a comunicação, o raciocínio, a capacidade de interação, a autorregulação, saem a ganhar com o contacto com o mundo exterior. O movimento lembra que o enquadramento legal não contempla o funcionamento de serviços educativos no pré-escolar sobretudo ao ar livre, nomeadamente ao nível de instalações. Por isso, pede que a legislação seja revista para, sustenta, “tornar viável a existência de novos serviços educativos menos dependentes de infraestruturas e que funcionem essencialmente no exterior, cumprindo todos os requisitos pedagógicos atuais”. 

O movimento avança com várias propostas, nomeadamente condições de segurança para atividades ao ar livre, um rácio máximo de seis crianças por adulto e grupos máximos de 18 crianças, e que todas as escolas do 1.º Ciclo tenham, no mínimo, cinco horas semanais ao ar livre com estratégias que promovam a cooperação e a livre exploração do contexto exterior. Na Escócia, exemplifica o grupo, a educação pré-escolar pode funcionar exclusivamente ao ar livre com o apoio do Governo. E a Alemanha é, adianta, “o país com o sistema formal de escolaridade ao ar livre mais amplo do mundo”, onde as atividades decorrem essencialmente ao ar livre no pré-escolar. 

https://www.educare.pt/noticias/noticia/ver/?id=188965&langid=1