quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Notícia - Querido afilhado

Chimpanzés machos que acolhem crias órfãs, leoas que amamentam os filhotes das suas presas... Os biólogos procuram descobrir o que leva alguns animais a perfilhar outros: um mecanismo de preservação do grupo, uma futura recompensa ou simples altruísmo?

"O órfão Mel estava muito fraco. Vagueava atrás de diferentes indivíduos, principalmente de machos adultos, mas, embora todos o tolerassem, nenhum mostrou especial interesse. Mesmo antes da morte da mãe, estava tão magro e letárgico, com a barriga tão inchada pelos parasitas, que não parecia ter muitas hipóteses de sobreviver. Nessa altura, recebi um telegrama: “Mel adoptado por Spindle”. Fiquei surpreendida, pois, pelo que sabíamos, Spin­dle, o filho de 12 anos do velho Sprout, não tinha tido a menor ligação com a mãe de Mel. Será que uma relação assim poderia vingar?”

Esta é uma das histórias de adopção relatadas por Jane Goodall no livro Through a Window. Pouco depois de a primatóloga inglesa ter regressado à terra natal destes símios, na República Democrática do Congo, pôde comprovar que Mel e o seu novo pai, Spindle, continuavam a constituir uma família. “Senti-me maravilhada com o interesse e o afecto manifestados pelo pai adoptivo. Spindle também tinha sido órfão. Seria, talvez, a sensação de perda, um sentimento de solidão, que o levou a manter essa relação com Mel?” Qualquer que fosse o motivo, o certo é que desempenhava na perfeição o papel de protector. “Partilhava o ninho nocturno com ele e, também, a comida. Esforçava-se por proteger a cria, apressando-se a afastá-la do caminho quando os machos adultos pareciam mais excitados. Quando Mel gemia durante as viagens, Spindle esperava por ele e deixava que lhe trepasse para os ombros, ou mesmo que se agarrasse na posição abdominal quando chovia ou estava frio. De facto, transportava-o assim com tanta frequência que o pêlo parecia gasto no sítio onde Mel se segurava com os pés.”

Estas observações de campo foram confirmadas por estudos mais aprofundados. Recentemente, Christophe Boesch e os seus colegas do Departamento de Primatologia do Instituto Max Planck, em Leipzig (Alemanha), publicaram os resultados de 27 anos de investigação com três populações de chimpanzés do Parque Nacional de Tai, na Costa do Marfim. Os especialistas registaram 18 casos de perfilhamento. Para isso, tiveram de definir com rigor o que se entende por adopção entre os chimpanzés: quando um adulto se comporta com um indivíduo jovem, que não é seu filho, do mesmo modo que uma mãe durante, pelo menos, dois meses. Semelhante comportamento manifesta-se sobretudo através da partilha de alimentos, ou no facto de esperar pela cria ou transportá-la nas deslocações. Durante quase três décadas de observações, 36 exemplares novatos perderam a mãe por diversas razões e sobreviveram mais de 60 dias. Todavia, no mesmo período, morreram 22 crias não desmamadas sem que algum membro da comunidade tentasse ajudá-las. Entre os 36 sobreviventes, 18 foram acolhidos por um adulto e, o que talvez pareça mais surpreendente, metade dos adoptantes eram machos. Os chimpanzés do sexo masculino raras vezes manifestam um comportamento especial em relação aos filhos e podem mesmo mostrar-se muito agressivos com as crias quando estão irritados.

As fotografias obtidas pela equipa são bastante reveladoras. Um exemplar chamado Freddy, por exemplo, apoia o pequeno Victor após a morte da mãe. Leva-o sempre às costas e chega a partilhar com ele 80 por cento das suas sementes de cola. O macho Porthos cuida de uma fêmea órfã durante 17 meses, comendo com ela e transportando-a, por vezes, em condições perigosas.

Por que será que decidiram adoptar? Os chimpanzés de Tai viajam, em média, oito quilómetros por dia, um percurso que se torna bastante árduo com uma cria às costas. Além disso, na hierárquica sociedade dos primatas, a adopção pode tornar-se um obstáculo para um exemplar adulto. De facto, os rivais sabem tirar proveito da situação e costumam atacar os adoptados para acossar os seus protectores. Joan Silk, uma antropóloga da Universidade da Califórnia em Los Angeles, não tem dúvidas de que existe altruísmo, mas considera que ainda há perguntas por responder nesta questão. Na sua opinião, os chimpanzés que se comportam assim esperam, seguramente, uma recompensa de algum tipo, como maiores favores no ritual de catar os piolhos ou mais aliados nas guerras sociais. Segundo Christophe Boesch, a adopção também promoveria a continuidade do grupo perante as ameaças, sobretudo nesta região, onde os leopardos impõem uma elevada taxa de mortalidade entre os chimpanzés.

Apesar disso, os comportamentos supostamente desinteressados constituem um enigma para os biólogos evolutivos. O etólogo britânico Richard Dawkins, autor de O Gene Egoísta, opina que a adopção constitui, simplesmente, um erro de identificação por parte da mãe, que acredita estar a criar o próprio filho. “Ocasionalmente, podem acontecer equívocos deste género na natureza”, indica, acrescentando: “Nas espécies que vivem em comunidades, um jovem órfão pode ser adoptado por uma fêmea estranha, provavelmente por alguma que tenha perdido uma cria (...). Na maior parte dos casos, deveríamos considerar a adopção, por comovedora que pareça, como um erro na regra estabelecida do egoís­mo genético. A generosa fêmea não está a fazer bem algum aos seus genes ao cuidar do órfão. Está a desperdiçar tempo e energia que poderia investir na vida dos seus próprios descendentes. Provavelmente, trata-se de um equívoco que se verifica tão raramente que a selecção natural não se deu dado ao trabalho de tornar o instinto maternal mais selectivo.”

Todavia, existe um exemplo de “comportamento faltoso” tão extraordinário entre os primatas que coloca em dúvida a teoria do gene egoísta, segundo a qual a evolução se processa em função dos genes e não dos indivíduos. É o caso de algumas fêmeas que, inconsoláveis por terem perdido uma cria, roubam outra e cuidam dela como se fosse sua. Do ponto de vista de Dawkins, tratar-se-ia de um duplo equívoco: a adoptante não só desperdiçaria tempo e energia, como libertaria uma rival do esforço que implica cuidar da cria e, além disso, possibilitaria que ela tivesse mais descendência.

A verdade é que os equívocos referidos pelo etólogo são bastante comuns entre muitos animais. Por exemplo, alguns não conseguem identificar a própria prole, assim como há crias incapazes de reconhecer os progenitores. É o caso de ratazanas, ratos e certas aves que alimentam qualquer avezinha que encontrem no ninho, mesmo que não lhes pertença. Por outro lado, bastantes animais sentem a necessidade instintiva de proteger as crias mais desamparadas. As leoas e as fêmeas de leoparado experimentam, por vezes, um irresistível impulso de proteger os filhotes de presas que abateram. Assim, deixam a mãe morta e lambem a cria, levam-na para um local seguro e chegam mesmo a oferecer-lhe os mamilos para poder mamar.

Os lobos e outros canídeos selvagens cuidam dos seus irmãos, e todas as fêmeas da alcateia vigiam as crias da loba dominante enquanto esta caça ou quando morre. Muitas cadelas chegam a sofrer uma gravidez psicológica: embora não estejam prenhas, manifestam os mesmos sintomas e podem ter leite embora não tenham parido. Os zoólogos pensam que se trata de um vestígio de um passado lupino, uma espécie de recordação genética de quando viviam em alcateias e deviam estar preparadas para encarregar-se das crias do par alfa.

Os cuidados aloparentais, isto é, aqueles dados às crias por qualquer indivíduo que não seja um dos seus progenitores, já foram documentados em mais de 120 espécies de mamíferos e 150 espécies de aves. Os especialistas sublinham que o fenómeno contribui para aumentar a taxa de sobrevivência dos adoptados aparentados com o adoptante, pelo que este pode expandir uma parte dos próprios genes. Além disso, adquire experiência ao cuidar dos jovens e, com essa atitude, poderá dar origem a uma espécie de altruísmo recíproco.Averiguou-se, ainda, que os animais são mais cuidadosos com crias que não são suas quando a comida é escassa ou quando é necessário colaborar para obtê-la.

A maioria dos casos de adopção ocorrem em “espécies K estrategas”, nome dado às que possuem uma vida reprodutiva limitada e têm pouca descendência mas investem, em contrapartida, muito tempo e recursos nos respectivos cuidados e desenvolvimento.

Outros factores que favorecem a perfilhação são a existência de colónias de criação demasiado povoadas ou a existência em grupos pequenos com estreitos laços de parentesco. É muito frequente, por exemplo, entre espécies que praticam cuidados comunitários. Assim, as leoas costumam amamentar todas as crias da manada, embora dêem preferência às suas, e as fêmeas de elefante partilham o leite se o grupo a que pertencem for exclusivamente composto por fêmeas adultas e crias. Entre os proboscídeos, existem mães auxiliares ou “tias” que vigiam o sono do bebé enquanto a mãe descansa após o parto, se interpõem entre o sol e as crias, abanam as orelhas para refrescá-las e correm em seu auxílio quando caem, por exemplo, na água. Além disso, uma dessas “tias” irá adoptar o recém-nascido no caso de morte da progenitora.

Muitas aves, sobretudo tropicais, também praticam este tipo de cuidados. De facto, observou-se em várias espécies que os filhos mais velhos permanecem alguns anos no ninho para ajudar a cuidar dos irmãos.

Por vezes, o instinto maternal é tão forte que algumas fêmeas chegam a sequestrar crias de outras espécies. Os babuínos e os macacos roubam cachorros para poderem criá-los, os quais se integram no bando e, quando se tornam adultos, alertam o grupo com os seus latidos para a presença de um predador.

O sexo também não constitui um obstáculo para esta pulsão. Entre os pinguins dos zoos, por exemplo, já se registaram muitos casos de pares homossexuais, tanto de machos como de fêmeas, que decidem adoptar crias. Já na natureza, é também muito comum, entre outras aves, a formação de casais do mesmo sexo. Por exemplo, em algumas colónias de albatrozes de Laysan (Phoebastria immutabilis), cerca de um terço dos pares com prole é formado apenas por duas fêmeas. Como cuidam apenas de uma cria, uma das progenitoras assume o papel de mãe adoptiva.

Por detrás de todos estes casos está subjacente uma das forças mais poderosas do planeta: o instinto maternal. Entre os mamíferos, é habitual a mãe limpar o recém-nascido com a língua. Este acto ajuda a romper as membranas fetais da cria e prepara as fossas nasais para respirarem com normalidade. A mãe também lhe seca a pele, o que permite ao recém-nascido preservar o calor e evita a dispersão de odores que iriam atrair predadores. Todavia, talvez o mais importante de todo o processo seja o que une mãe e filho através do cheiro.

No caso das cabras, a união é selada em dez minutos. Passado esse tempo, a fêmea só amamentará a própria cria. No caso das ovelhas, o tempo passa para o dobro. Durante séculos, os pastores aproveitaram este comportamento para proporcionar mães adoptivas às crias órfãs: têm de escolher uma ovelha adulta cujo filhote nasceu morto, e a órfã será aceite se a mãe a conhecer imediatamente após ter perdido a sua cria. Porém, se tiverem passado várias horas desde o parto, os “filhos adoptivos” serão rejeitados. Em alguns casos, os pastores atam a pele do recém-nascido morto à cria órfã para assegurar a união com a nova mãe.

Nos mamíferos, o instinto maternal desenvolve-se por completo nos primeiros dias após o nascimento, um fenómeno que levou os cientistas a interrogar-se sobre o papel desempenhado pelas hormonas neste processo. Após o parto, a progenitora experimenta importantes alterações físicas e psicológicas num período muito curto, em grande parte ocorridas porque se produz, com a expulsão da placenta, uma brusca descida nos níveis da progesterona e dos estrogénios. Pelo contrário, a presença da prolactina favorece a produção de leite. Desde a década de 1960, diversos estudos mostraram que os machos com concentrações mais elevadas desta hormona manifestam maior tendência para cuidar das crias.

Super Interessante
A.M.J.C.

Ficha de Avaliação - 5ºAno


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Documento - Em caso de urgência contactar


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Notícia - Gelo derrete cada vez mais depressa

O degelo nos pólos ocorre mais depressa do que o previsto com consequente subida do nível da água do mar e a aceleração do aquecimento global. Até 2100 o mar subirá 1,8 metros revelou o Centro Nacional de Estudos Espaciais de Toulouse, França. Estimativas anteriores, baseadas em medições efectuadas entre 1980 e 1999, apontavam para uma subida de 60 centímetros.


A divulgação dos resultados do estudo para o Ano Polar Internacional, realizado em 2007 e 2008 por milhares de cientistas, revelou ontem que o aquecimento da Antárctida "é maior do que o previsto, enquanto os gelos Árcticos estão a diminuir, ao mesmo tempo que na Gronelândia o gelo está a derreter mais rapidamente".

Em resultado do degelo a velocidade com que o nível do mar está a subir é o dobro da verificada no século XX. "Entre 1993 e 2008 a taxa média global de subida foi de 3,4 mm por ano, enquanto entre 1950 e 2000, a elevação média do mar era de 1,8 mm por ano", disse Anny Cazenave do Centro de Estudos de Toulouse.

Entretanto, cientistas do Centro de Vigilância Britânico da Antárctica descobriram que por debaixo da camada de gelo de três quilómetros do Pólo Sul se esconde uma cordilheira semelhante aos Alpes.

Segundo o geofísico Fausto Ferraccioli, os mapas que a sua equipa realizou são "a primeira página de um novo livro", cujo objectivo final é ajudar a prever como vão reagir os glaciares do Pólo Sul perante as alterações climáticas e consequente subida da água do mar.

João Saramago

Powerpoint - Factores de Risco Cardiovascular


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terça-feira, 15 de setembro de 2015

EFA - MV - Conteúdo - Áreas de Figuras Planas - Matemática para a Vida


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Notícia - 500 astronautas no Espaço

Passaram 48 anos desde que o Mundo foi surpreendido pela difusão de uma extraordinária notícia: o Homem estava, pela primeira, vez no Espaço. Efectivamente, foi no dia 12 de Abril de 1961 que a nave soviética ‘Vostok’, levando a bordo Yuri Gagarin, deixou a Terra e durante 108 minutos – o tempo de uma órbita em torno do Planeta – passeou pelo quase desconhecido.


Nessa altura já tinham sido dados os primeiros passos na investigação espacial, com o lançamento, no final de 1957, de dois satélites soviéticos, um deles com a cadela Laika, o primeiro ser vivo a ir para o Espaço. Todavia, ainda nenhum homem havia lá estado e Yuri Gagarin deveria dar respostas a perguntas, tais como se o Homem podia viver, trabalhar e orientar-se no Espaço e manejar os sistemas das naves espaciais.

O seu voo iniciou uma nova era na conquista do Espaço, por isso 12 de Abril atingiu importância internacional, tornando-se o Dia Internacional da Aviação e Cosmonáutica.

A disputa entre os EUA e União Soviética (URSS) pela conquista do Espaço foi o grande impulso para a exploração espacial e resultou em grandes avanços científicos e tecnológicos.

Acabada a Guerra Fria, que opunha essas duas grandes potências mundiais, e na continuidade das operações Mir e Skylab e do planeado Columbus europeu, nasceu, em 1998, a Estação Espacial Internacional (ISS), actualmente ainda em construção, que representa a permanência humana no Espaço e, sobretudo, a cooperação internacional desejada na conquista espacial sem desperdício inútil de esforços e de dinheiro.

A maior aventura já empreendida pelo Homem tem alguns marcos e devemo-lo sobretudo à coragem dos astronautas, cosmonautas (na designação russa) e taikonautas (na versão chinesa) – 493 até hoje – feitos em tudo semelhantes à dos navegadores portugueses quando se lançaram nas desconhecidas travessias oceânicas do século XV.

Mário Gil

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

EFA - MV - Ficha de Trabalho - Matemática para a Vida


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Notícia - Já começou o primeiro passeio espacial para reparar o Hubble


A mais de 600 quilómetros de altitude sobre a Austrália, os astronautas do vaivém Atlantis começaram já a trabalhar para pôr de novo o telescópio espacial Hubble em forma. Ancoraram o telescópio de 10 metros de comprimento ao compartimento de carga do vaivém, usando o braço robótico da nave, para uma primeira análise.

A primeira saída dos astronautas para fora do vaivém, para começar a meter as mãos na massa nas reparações do Hubble, está agora a começar. Será Grunsfeld, de 50 anos, e o geólogo Drew Feustel, de 43 anos, que faz a sua primeira viagem espacial.

“Este velhinho com 19 anos de espaço ainda está numa forma fantástica”, comentou o astronauta John Grunsfeld, que não é nenhum novato: já participou em duas outras missões para fazer as reparações necessárias para que o Hubble continue a ser o olho da humanidade no Universo, e já fez cinco passeios espaciais para pôr o telescópio em forma.

O exterior do telescópio foi ainda ontem à noite inspeccionado com câmaras instaladas no braço robótico do vaivém – apesar do desgaste da radiação ultravioleta e de vários impactos de detritos espaciais, o Hubble nem está assim em tão mau estado. 

Hoje, os astronautas vão remover uma das câmaras do Hubble, para a actualizar e colocar novo equipamento. Vão ter de se empoleirar no braço robótico do vaivém, e instalar protecções para evitar que os painéis solares do telescópio sofram com as vibrações dos trabalhos de recuperação.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Higiene e Segurança no Trabalho - Relatório de verificação de segurança - Máquinas de movimentação de terras


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Ficha de Avaliação - 5ºAno


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Notícia - Lâmpadas vivas

Sobrevivente de Nagasaki e Prémio Nobel da Química, Osamu Shimomura, um investigador japonês estabelecido nos Estados Unidos, dedicou a vida ao estudo da bioluminescência. As suas descobertas encontraram aplicações na medicina, na genética e na biotecnologia.

Shimomura diminui a intensidade da luz no laboratório, retira um punhado de bichinhos secos, que parecem estar a transformar-se em pó, de um frasco marcado com a etiqueta Cypridina-1944, coloca-os num almofariz, acrescenta água e começa a moer. Em breve, brota do recipiente uma suave luminescência azul, que se intensifica à medida que se aplica maior pressão. O fulgor deste ser marinho (Cypridina luciferin, do grupo dos ostracodes, um género de crustáceos microscópicos) iluminou o caminho do investigador, de 82 anos, desde os dias negros do pós-guerra no Japão até à conquista do Prémio Nobel da Química, em 2008. O professor jubilado do Marine Biological Laboratory, no Massachusetts, é responsável pela descoberta da proteína verde fluorescente (GFP), “uma das ferramentas mais importantes da biologia moderna”, de acordo com a Academia sueca.

A proteína pode ser encontrada na Aequorea victoria, uma alforreca bioluminescente, isto é, com capacidade para gerar a sua própria luz. A descoberta revolucionou a biologia molecular em 1961 e, hoje, é possível manipular esse “farol” químico para iluminar o interior da célula.

Graças a Osamu Shimomura (e a Martin Chalfie e Roger Y. Tsien, que partilharam o Nobel), a GFP pode ser introduzida numa célula viva para observar as suas alterações e compreender, por exemplo, a organização dos neurónios, a propagação de um tumor ou a interacção das proteínas entre si. “A GFP foi uma consequência acidental do meu trabalho. O objectivo inicial era a aequorina, a proteí­na da Aequorea que produz luz azul. Queria compreen­der o processo químico da emissão de luz pe­los animais, fundamental para a ciência”, explica.

A aventura começara décadas atrás com a Cypridina, muito abundante no Japão. Na década de 1940, os soldados nipónicos recorriam à sua luz para ler os mapas de noite, nos campos de batalha; para isso, bastava deitar algumas gotas de saliva num pouco de pó de Cypridina moída. A bioluminescência deste crustáceo produz-se pela oxidação do pigmento luciferina e pela acção da enzima catalizadora luciferase. Determinar a natureza e o funcionamento de ambos os elementos tornou-se o Santo Graal da bioquímica de então.

O jovem Shimomura cresceu num dos períodos mais difíceis da história do seu país. O pai, coronel do Exército, levou a família para longe de Osaka durante a Segunda Guerra Mundial, pois receava que a cidade fosse alvo de bombardeamentos. Instalaram-se numa casa a dez quilómetros de Nagasaki... “No primeiro dia da escola secundária, disseram-nos que não ia haver aulas porque os alunos tinham de ir trabalhar na indústria bélica, pelo que fui parar a uma fábrica de aviões nos arredores de Nagasaki”, recorda. “A fábrica foi atacada pelos caças B-29 norte-americanos com bombas de magnésio e vi morrer muitos dos meus colegas. No dia 9 de Agosto de 1945, as sirenes voltaram a tocar como sempre.” Do topo de uma colina, viu um único avião inimigo lançar três pequenos pára-quedas com objectos alongados. “Quando voltei ao trabalho, uma luz intensa invadiu o interior do edifício e cegou-me temporariamente. Menos de um minuto depois, soou uma explosão e a onda de choque causou-me dor nos ouvidos. Depois, tudo se tornou cinzento. No regresso a casa, caía uma chuva negra. Quando cheguei, a minha avó tirou-me a roupa e deu-me banho. Talvez me tenha salvo da radiação.”

No pós-guerra, não havia futuro para os jovens no Japão. Muitos professores tinham sido mortos nos bombardeamentos, pelo que Shimomura não conseguiu concluir o ensino secundário. Embora continuasse a estudar por sua conta, as tentativas para se matricular na universidade foram rejeitadas. Um dia, deslocou-se à de Nagoya para pedir emprego a um professor catedrático, mas este tinha viajado. Deambulando, desiludido, pelos corredores da Faculdade de Química, deparou com o professor Yoshimasa Hirata, meio surdo e bastante distraído, que supôs que o jovem queria trabalhar para ele. “Podes vir para o meu laboratório para me ajudares a isolar e purificar compostos.” Shimomura aceitou de imediato.

No primeiro dia, Hirata pegou numa pequena quantidade de Cypridina seca, fê-la refulgir de azul e disse-lhe: “Não sabemos nada sobre isto. Começa por isolar e estudar a luciferina deste organismo.” Shimomura conta: “Comecei a trabalhar tendo como única ajuda a pouca literatura existente, quase toda em inglês. Sabia apenas que a luciferina era o combustível que causava a bioluminescência, mas ignorava se se tratava de uma proteína, de um açúcar, de um aminoácido ou de outro tipo de molécula desconhecida. Das dezenas de milhares de substâncias que compõem a Cypridina, teria de isolar uma que fosse altamente instável, que se degradasse rapidamente quando exposta ao oxigénio.”

Fez as experiências em câmaras de hidrogénio, um gás perigoso devido à sua natureza explosiva. Cada tentativa exigia uma semana de trabalho mas, embora a amostra fosse mais pura do que a anterior, não conseguia que a luciferina se cristalizasse. Até que, uma tarde, deixou por acaso uma pequena quantidade da substância num meio muito ácido. No dia seguinte, observou, espantado, que se tinha formado uma camada de cristais vermelhos na solução. Eureka! Tinha conseguido.

No final dos anos 50, aceitou uma oferta de emprego da Universidade de Princeton e não tardaria a sentir-se fascinado pelos lampejos luminescentes da Aequorea, muito abundante na costa norte-americana do Pacífico. Durante um Verão que passou a trabalhar num laboratório de Vancouver, Shimomura e a mulher, Akemi (também especializada em biologia marinha) pescaram 9000 alforrecas com redes de limpar piscinas. Extraíam das medusas as tiras de órgãos bioluminescentes com tesouras, envolviam-nos em panos de algodão e espremiam-nos para extrair o líquido luminoso, que podia brilhar durante várias horas. Contudo, suspendiam a reacção e separavam a luciferina da luciferase o mais depressa possível.

“Se a revolução molecular se tivesse verificado antes, Shimomura não teria tido necessidade de apanhar tantos espécimes, pois poderia ter reproduzido a proteína em grande quantidade dentro de uma bactéria, como é actualmente feito pelos laboratórios”, escreveu o oceanógrafo David Gruber. O certo é que a descoberta foi feita a tempo: se os seus estudos se tivessem prolongado, já não teria encontrado um único exemplar da alforreca, actualmente extinta nas águas do Pacífico.

Por fim, descobriu que o segredo da bioluminescência da Aequorea era uma fotoproteí­na, que baptizou com o nome de aequorina: ao ser activada com cálcio, emitia uma luz azul. “A medusa geria a concentração deste elemento nas suas células para controlar a produção luminosa”, explica Shimomura. “Quando a incomodam, o nível de cálcio sobe e acende-se o alarme, que parece um néon intermitente.” Em 1961, observou que a luminosidade da medusa, contemplada sob luz ultravioleta, adquiria uma tonalidade esverdeada, devido à acção da GFP, que emite bioluminescência na zona verde do espectro visível. O facto de a GFP estar relacionada com o nível de cálcio é determinante: a mobilidade deste elemento desempenha um papel fundamental em muitos processos biológicos, como a contracção muscular, a transmissão de impulsos nervosos, a libertação de neurotransmissores, a divisão celular ou a segregação de insulina. A possibilidade de “aplicar a fluorescência molecular para seguir a rota do cálcio permite melhorar o conhecimento sobre numerosas doenças”.

Na década de 80, Martin Chalfie, neurobiólogo de Harvard, quis saber se seria possível implantar a GFP da alforreca no verme Caenorhabditis elegans, de forma a poder sintetizar a proteína e produzir luz. Assim, poder-se-ia observar em directo os genes que intervêm na bioluminescência. Chalfie tinha razão: a GFP podia fazer brilhar criaturas diferentes da Aequorea. Era perfeita para a revolução da biologia molecular e foi de imediato usada em experiências com genes de diversas plantas, rãs, peixes, cabras, ratos, macacos...

O bioquímico norte-americano de origem chinesa Roger Y. Tsien foi ainda mais longe e propôs-se estudar a célula como se esta fosse uma cidade e quisesse espiar os seus habitantes nos afazeres quotidianos: tratava-se de observar como nascem as moléculas de proteínas e como se modificam, viajam, colaboram, competem e chegam mesmo a “assassinar” outras. O seu estudo é semelhante a uma antropologia celular. Tsien pretendia inventar técnicas vi­suais com tintas fluorescentes que permitissem aos neurofisiólogos observar o cérebro sem necessidade de abrir a cabeça dos doentes. “Os corantes modificam a intensidade de fluorescência na presença de iões de cálcio livres dentro da célula, tal como se verifica com a alforreca Aequorea para produzir luz. Os iões de cálcio colam-se às proteínas e fazem-nas agir. Só é possível estudar o processo em células vivas”, explica Gruber.

Tsien descreveu a estutura da molécula da GFP, o que lhe permitiu combinar os 238 aminoácidos da proteína e inventar mutações. Foi assim que encontrou a fórmula para criar uma proteína sintética superbrilhante, bastante mais visível do que a natural, e tintas de todas as cores, de modo que o interior da célula, quando se pretende estudar as proteínas, mais parece um quadro de arte contemporânea.

Hoje, oncologistas, imunologistas, virulogistas, neurobiólogos, biólogos celulares e botânicos recorrem às proteínas fluorescentes de Tsien, que refulgem alegremente dentro de todo o género de cobaias. São produzidas em massa na empresa Aurora Biosciences, que lhe pertence e cujo capital ultrapassa os 1500 milhões de dólares. Alguns laboratórios fabricam criaturas de ficção científica, como ratos com caudas e orelhas verdes, gatos que irradiam uma suave tonalidade azul iridiscente e coelhos cor-de-rosa. Há mais de 24 mil estudos publicados sobre a GFP e suas aplicações. Shimomura ouve o número, sorri e repete o mantra com que começava as suas aulas: “Nunca te dês por vencido. Se encontrares um tema interessante, estuda-o até ao fim. Se enfrentares dificuldades, ultrapassa-as. Não desanimes.”

Brilho selectivo
No início de Junho, o Instituto Tecnológico do Massachusetts anunciou um novo método para marcar moléculas com fluorescência, que irá permitir observar a actividade celular como nunca aconteceu antes. O facto é que a molécula da proteína verde fluorescente é tão grande (possui 238 aminoácidos) que pode interferir no trabalho normal de outras proteínas que também se queira estudar. O método, denominado PRIME (sigla de probe incorporation mediated by enzymes), baseia-se na enzima ligase fluoróforo, que é geneticamente acrescentada a cada célula que se pretende observar. A nova sonda emite uma fluorescência azul, é muito menor do que a GFP e não dificulta a passagem das proteínas submetidas a vigilância, que podem entrar livremente no núcleo da célula sem ter de ofuscá-la. A enzima “sabe” que só deve aplicar a fluorescência às proteínas que se encontram em determinadas re­giões celulares, e não a todas.


Super Interessante
A.P.S.

Conteúdo - Teatro dos Alimentos


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