quarta-feira, 24 de abril de 2019

Plantas que curam - Borragem



Nome científico: Borrago

Algumas pessoas utilizam esta planta para saladas. É uma erva anual, da família das Borrináceas. Suas folhas são ásperas e as flores grandes, normalmente azuladas, mas também podem ser vermelhas. Elas se reúnem em cachos na extremidade da haste. A borragem é muito procurada para fins medicinais devido a suas propriedades emolientes, depurativas e sudoríferas. 

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Azeda-Crespa


Nome científico: Rumex Crispus

Muito utilizada na preparação de remédios caseiros, pois tem entre suas funções terapêuticas a propriedade de reconstituinte, laxante e adstringente para a tonificação da pele. É uma planta herbácea (erva) perene (que não precisa ser replantada), pertencente à família das Poligomáceas.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Angélica


Nome científico: Angelica Officínalis

Pertence à família das Umbelíferas. É uma planta herbácea (erva.) que possui caule reto e com ramos, que pode chegar à altura de 2 m. As flores, rosadas, são pequenas e perfumadas. A Angélica é indicada, principalmente, para problemas estomacais e também como expectorante. EMÍste ainda uma outra espécie, a Angélíca Silvesáis, que possui as mesmas propriedades, mas ainda pode ser usada como planta ornamental, com a vantagem de servir como estimulante de apetite para pessoas anêmicas.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - AMI


Nome científico: AmmíMajus

É encontrada na Itália, nos terrenos áridos. Pertencente à família das Umbelíferas, possui uma raiz lenhosa, caule cespitoso. Pode chegar à altura de 1,5 m. Seus ramos são finos e cilíndricos e as folhas franjadas. As flores são esbranquiçadas e amarelas e os frutos contêm várias se- mentes. Esta planta possui várias utilidades terapêuticas, sendo indicada, principalmente, para problemas digestivos e favorecimento da secreção láctea e menstruações.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Alteia


Nome científico: Althaea Officinalis

Pertencente à família das Malváceas, a Altéia é uma planta perene (que não precisa ser replantada). Seu caule é reto e pode atingir a altura de dois metros. Suas flores possuem cinco pétalas e as folhas são ovais, cobertas por uma lanugem prateada que dá a elas uma coloração prata. É também conhecida como malvaísco ou malvarisco.
A Altéia pode ser usada como laxante, calmante, diurético  e expectorante. Esta planta se adapta bem a terrenos úmidos e pantanosos.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Alfazema


Nome científico: Lavandula Officinalis

Esta talvez seja uma das plantas aromáticas mais populares de nosso pais. Sua origem, entretanto, é européia. Pertence também à família das Labiadas. É um arbusto perene, isto é, que não precisa ser replantado, cuja altura varia entre 50 cm a 1 m. Suas folhas são longas e finas, cobertas por uma lanugem esbranquiçada, distribuídas em vários ramos. As flores são azul-violeta, reunindo-se em glomérulos com a forma semelhante a uma espiga.

A alfazema é indicada para os casos de nevralgia, excitação nervosa, insônia, vertigens, laringites, entre outras aplicações, além de sua utilização na perfumaria. Para a preparação de medicamentos, utilizam-se suas flores, que devem ser dessecadas ao ar livre e à sombra.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Alfavaca


Nome científico: Ocinum Basilicum

Pertencente à família das Labiadas é uma planta herbácea (erva), originária dos países com clima tropical, a exemplo do Brasil. A Alfavaca é aromática e pode ser muito útil na cozinha para a preparação de molhos e sopas, conferindo um paladar especial ao prato. Quando dessecada conserva intacto o seu perfume.

É uma planta anual (que só cresce em determinadas épocas do ano). Apresenta-se com uma haste reta, suas folhas são verdes e brilhantes, um tanto carnosas. Para a preparação de medicamentos são utilizadas suas folhas frescas ou secas.

É conhecida ainda pelos seguintes nomes: manjericão-de-folha-larga, manjericão-dos-cozinheiros, erva-real, remé-dio-de-vaqueiro etc.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Alecrim


Nome científico: Rosmarinus officinalis

Segundo as crendices populares, o alecrim é uma planta que ajuda a espantar o “mau olhado”, a inveja. Mas essa planta, que pertence à família das Labiadas, tem ainda inúmeras funções terapêuticas. É indicada, entre outras coisas, para o tratamento de abscessos, asma e reumatis- mo. 0 alecrim apresenta caule lenhoso, com folhas pequenas e finas. Suas flores são azuladas, possuindo também frutos. Esta planta exala um perfume forte, por isso é utilizada pela indústria de perfumes. Uma outra propriedade importante do alecrim é a de estimulante, dando força e vigor às pessoas com fraqueza e exaustão devido a atividades físicas e intelectuais.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam - Acácia


Nome científico: Acácia Horrida, Acácia Senegal

A Acácia pertence à família das Leguminosas Mimosídeas. Seus ramos são fortes e suas flores muito perfumadas. É através de incisões no tronco dessa planta, originaria da África do Sul, que se extrai a goma arábica, uma substância densa e pegajosa. A Acácia é recomendada para o tratamento de problemas intestinais, queimaduras, sendo indicada ainda para uso veterinário, uma vez que constitui um excelente remédio para nefrite canina.

Plantas que curam
Hugo Caravaca

Plantas que curam


Desde os tempos mais remotos, as plantas sempre estiveram presentes na vida do homem. A utilização dos vege- tais com fins terapêuticos é anterior ao desenvolvimento da ciência. Cada povo possui sua própria listagem de ervas medicinais, geralmente plantas comuns no território em que habitam, cujas aplicações são transmitidas através de ge- rações. Nas tribos indígenas, por exemplo, o pajé, uma das maiores autoridades depois do cacique, nada mais é que um profundo conhecedor dos segredos do mundo vegetal, um curandeiro naturalista.

É difícil precisar como as propriedades terapêuticas dessas plantas foram descobertas. Talvez por instinto, por intuição e até mesmo através da observação dos animais, que se valem dessas valiosas plantinhas para a cura de seus males.

Hoje, apesar do desenvolvimento da ciência e da medicina, as pessoas têm procurado tratamentos altemativos, mais naturais, que não apresentem efeitos colaterais. Este livro reúne uma série de receitas, explicadas; passo-a-passo, relacionando as ervas indicadas para cada caso, bem como a preparação dos remédios. No último capítulo também relacionamos algumas das plantas citadas, com informações e curiosidades a respeito de cada uma delas.


Plantas que curam
Hugo Caravaca

terça-feira, 23 de abril de 2019

Dicionário Voltaire - Antropófagos


Falamos do amor. É duro passar de  pessoas que se beijam a pessoas que se comem. Não resta dúvida terem existido antropófagos. Encontramo- los na América, onde é possível que  ainda  os haja. Na antigüidade não foram os ciclopes os únicos a se alimentarem às vezes de carne humana. Conta Juvenal que entre os egípcios — esse povo tão sábio, tão famigerado por suas leis, esse povo tão piedoso que adorava crocodilos e cebolas — os tentiritas comeram certa vez um inimigo que lhes caiu nas mãos. Não o diz de outiva: estava no Egito, porto de Têntiro, quando se cometeu o crime quase aos seus olhos. E lembra, ao relatar o caso, os gascões e  saguntinos, que outrora se alimentaram de carne dos próprios compatriotas.

Em 1725 trouxeram-se quatro selvagens do Mississipi a Fontainebleau — Tive a honra de falar-lhes. Havia entre eles uma dama do país, a quem perguntei se havia comido gente. Respondeu-me muito singelamente que  sim. Fiquei um tanto escandalizado, e ela desculpou-  se dizendo ser preferível comer o inimigo, depois de morto, a deixá-lo servir de pasto às feras; que demais o vencedor merecia a preferência. Nós outros, em batalha campal ou não, por fas ou por nefas matamos nossos vizinhos e. pela mais vil

recompensa pomos em função o engenho da morte. Aqui é que está o horror. Aqui é que está o crime — Que importa que depois de morto se seja comido por um soldado, por um urubu ou por um cão?
Respeitamos mais os mortos que os vivos. Cumpria respeitar uns e outros. Bem fazem as nações que chamamos civilizadas em não meter no espeto os inimigos vencidos. Porque se fosse permitido comer os vizinhos, começariam a comer-se entre si os próprios compatriotas, o que seria grande desdouro para as virtudes sociais. Mas as nações que hoje são civilizadas não o foram sempre. Todas elas foram muito tempo selvagens. 

E com o sem número de revoluções de que tem sido palco o mundo, o gênero humano foi ora mais ora menos numeroso. Sucedeu com os homens o que hoje sucede com os elefantes, leões, tigres, cujas espécies minoraram conside- ravelmente. Quando uma região estava ainda escassamente povoada de seres humanos e as artes eram rudimentares, os homens se dedicavam à caça. O hábito de se alimentarem do que matavam facilmente levou-os a tratar os inimigos como tratavam os cervos e javalis. A superstição fez imolar vítimas humanas. A necessidade as fez comer.
Qual o crime maior: reunir-se religiosamente para cravar em honra da Divindade uma faca no coração de uma menina enfitada, ou comer um bandido morto em legítima defesa?

No entanto há muito mais exemplos de meninas e meninos sacrificados que de meninas e meninos comidos. Quase todas as nações conhecidas sacrificaram crianças. Os judeus imolavam-nas. É o que se chamava o anátema um verdadeiro sacrifício. Ordena-se no capítulo 27 do Levítico não se pouparem as almas viventes prometidas, porém em ponto algum se prescreve que sejam comidas. Isto era outro caso: tratava- se exclusivamente de uma ameaça. Como vimos, disse Moisés aos judeus que caso não observassem as cerimônias, não só teriam ronha, como as mães comeriam os próprios filhos. Positivamente no tempo de Ezequiel os judeus deviam comer carne humana, pois diz esse profeta no capítulo 39 que Deus os faria comer não apenas os cavalos dos seus inimigos, mas ainda os cavaleiros e os outros guerreiros. É positivo. De fato, por que não teriam os judeus sido antropófagos? Seria a última coisa a faltar ao povo de Deus para ser a mais abominável nação da terra.

Li nas anedotas da história da Inglaterra do tempo de Cromwell que uma sebeira de Dublin vendia excelentes candeias feitas com gordura de inglês. Certa vez queixou-se-lhe um de seus fregueses de que as candeias já não eram tão boas como antes. — Ah, — disse ela — é que este mês faltaram ingleses. — Pergunto eu: quem o mais culpado: quem passava os ingleses à faca ou a mulher que fazia velas com sua banha?

Dicionário Filosófico (1764)* Voltaire (1694-1778)
Edição Ridendo Castigat Mores
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Dicionário Voltaire - Anjo


Enviado em grego. Baldio será acrescentar que os persas tinham peris, os hebreu malakhs, os gregos seus daimones. Mas talvez nos aclare saber que uma das primeiras idéias do homem foi interpor seres intermediários entre a Divindade e nós. São os demônios, os gênios ideados pela antigüidade. O homem sempre criou os deuses à sua imagem. Viam-se os príncipes transmitir  suas ordens por mensageiros: então a Divindade também tinha seus correios. Mercúrio, Isis, eram mensageiros, arautos.

Os hebreus — povo conduzido pela própria Divindade — a princípio não deram nomes aos anjos que por fim Deus condescendia em enviar- lhes. Tomaram de empréstimo os nomes que lhes davam os caldeus, quando a nação judaica esteve cativa em Babilônia. Miguel e Gabriel são referidos pela primeira vez por Daniel, escravo entre aqueles povos. O judeu Tobias, que vivia em Nínive, conheceu o anjo Rafael, que viajou com seu filho para ajudá-lo a reaver certa soma que lhe devia o judeu Gabael.

Não se faz nas leis dos judeus, isto é, o Levítico e o Deuteronômio, a menor menção à existência dos anjos. Muito menos ao seu culto. Tão pouco criam em anjos os saduceus.

Nas histórias judaicas, porém, os anjos são a basto falados. Eram corporais e tinham asas nas costas, como imaginaram os antigos que tivesse Mercúrio nos calcanhares — Às vezes escondiam-nas sob as vestes.

Como não teriam corpo se bebiam e comiam? Se os habitantes de Sodoma quiseram cometer o pecado da pederastia com os anjos que foram à casa de Ló?
Segundo Ben Memon, admitia a antiga tradição judaica dez graus, dez ordens de anjos — Primeira: cheios acodesh — puros, santos. Segunda: ofamim — rápidos Terceira: oralim — fortes. Quarta: chasmalim — flamas. Quinta: seraphim — centelhas. Sexta: malakhim — mensageiros, deputados. Sétima: eloim — deuses ou juizes. Oitava: ben eloim — filhos dos deuses. Nona: cherubim — imagens. Décima: ychim — animados.

Não consta nos livros de Moisés a história da queda dos anjos. Seu primeiro testemunho dá- no-lo o profeta Isaías, que, apostrofando o rei, exclama: “Que é feito do exator das tribos? Os pinheiros e cedros regozijam-se com sua queda. Como caíste do céu, ó Helel, estrela da manhã?”(4). Traduziu-se Helel pela palavra latina Lúcifer. Depois, em sentido alegórico, deu-se o nome de Lúcifer ao príncipe dos anjos que atiçaram a guerra no céu. Finalmente o termo, que significa fósforo e aurora, tornou-se nome do diabo.

A religião cristã funda-se na queda dos anjos. Os que se revoltaram foram precipitados das esferas que habitavam ao inferno, no centro da terra, e transmudaram-se em diabos. Um diabo transfigurado em serpente tentou Eva e desgraçou o gênero humano. Jesus veio resgatar os homens e vencer o diabo, que ainda nos tenta. Essa tradição fundamental, contudo, só a refere o livro apócrifo de Enoque. E ainda assim muito outra da tradição aceita.

Não trepida Santo Agostinho (carta centésima nona) em reportar tanto aos anjos bons como aos anjos maus corpos livres e ágeis. Reduziu o papa Gregório II a nove coros, nove hierarquias ou ordens os dez coros de anjos admitidos pelos judeus. São eles: serafins, querubins, tronos, dominações, virtudes, potências, arcanjos e finalmente os anjos, que emprestam o nome às oito outras hierarquias.
Tinham os judeus no templo dois querubins, cada um com duas cabeças — uma de boi e outra de águia — e seis asas. Representamo-los hoje sob a forma de uma cabeça solta com duas asinhas abaixo das orelhas.

Pintamos os anjos e os arcanjos sob a figura de jovens com um par de asas nas costas. Quanto a tronos e dominações, ainda ninguém se lembrou de retratá-los.

Diz Sto. Tomás (questão centésima oitava, artigo 2°.) estarem os tronos tão próximos de Deus quanto os serafins, pois é sobre eles que se acha sentada a Divindade. Scot contou um bilhão de anjos. Tendo o antigo mito dos gênios bons e maus passado do Oriente à Grécia e Roma, consagramo-lo admitindo para cada pessoa um anjo bom e outro mau. Um ajuda-a e o outro molesta-a do nascimento, à morte. Ainda não se estabeleceu, contudo, se esses anjos bons e maus mudam continuamente de posto ou são rendidos por outros. Consulte-se sobre o ponto a Suma de Sto. Tomás

Outro ponto que tem dado pano a muita controvérsia é o lugar onde se conjuntariam, os anjos — no ar, no vácuo ou nos astros? Não aprouve a Deus pôr-nos a par dessas questões.

Dicionário Filosófico (1764)* Voltaire (1694-1778)
Edição Ridendo Castigat Mores
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Dicionário Voltaire - Amor Socrático


Por que motivo um vício que se fosse geral extinguiria o gênero humano, atentado infame à natureza, é contudo tão natural ? Parece o último degrau da corrupção refletida — Entanto manieta de cotio adolescentes que nem sequer tiveram tempo de ser corrompidos. Entra corações tenros que não conhecem nem a ambição, nem a fraude, nem a sede de riqueza. É a juventude cega que, por instinto mal definido, se precipita na depravação apenas dobra a infância.

Bem cedo se manifesta a inclinação recíproca dos sexos. Mas, diga-se o que se disser das mulheres africanas e da Ásia meridional, essa inclinação é geralmente muito mais forte no homem que na mulher. É uma lei que a natureza ditou aos animais. É sempre o macho que ataca a fêmea.

Sentindo essa força que a natureza começa a insuflar-lhes e não encontrando o objeto natural do instinto, atiram-se os jovens machos da nossa espécie sobre o que melhor se lhe semelhe. Não raro, pela frescura da tez, pelo lustre das cores, pela doçura dos olhos, durante dois ou três anos um jovem parece-se a uma rapariga. Se o amamos, é porque a natureza se equivoca. Amamos nele o sexo a que evoca sua beleza. Até que, dissipando-se a semelhança, a natureza se corrige

Citraque juventam oetatis breve ver et primos carpere ƒlores(3)

Assaz sabido é ser esse equívoco da natureza muito mais comum nos climas suaves que nos gelos do norte. Porque nos climas mais doces o sangue é mais quente e mais freqüente a ocasião. Daí o que não se considera mais que uma fraqueza no jovem Alcibíades ser uma abominação num marinheiro holandês ou num vivandeiro moscovita.
Não posso admitir que, como se pretende, tenham os gregos autorizado semelhante licenciosidade. Cita-se o legislador Sólon  por haver dito em dois maus versos:
Algum dia inda amarás um glabro e belo rapaz.
Mas seria Sólon legislador quando escreveu essa ridícula parelha? Ainda era jovem. E quando o libertino se fez sábio, não iria incluir .tamanha infâmia nas leis da sua república. É como se se acusasse Teodoro de Besis de ter pregado o homossexualismo em sua igreja por haver, na juventude, dedicado versos ao jovem Cândido e dito:

Amplector hunc et illam.

Abusa-se do texto de Plutarco, que, em suas tagarelices no Diálogo do Amor, faz dizer a uma personagem que as mulheres não são dignas do amor verdadeiro. Outra personagem, porém, sustenta devidamente o partido das mulheres.
Certo é, tanto quanto o pode ser a ciência da antigüidade, que o amor socrático não era um amor infame. A palavra amor foi que enganou. O que se chamavam os amantes de um jovem era nem mais nem menos o que são hoje os infantes de companhia dos nossos príncipes, os jovens companheiros de educação de um menino distinto, participando dos mesmos estudos, dos mesmos exercícios militares — instituição guerreira e santa de que se abusou como das festas noturnas e das orgias.

A tropa dos amantes instituída por Laio era um corpo invencível de jovens guerreiros unidos pelo juramento de dar a vida uns pelos outros. Foi o que de mais belo possuiu a disciplina antiga.
Asseveram Sexto Empírico e outros que o homossexualismo tinha guarida nas leis da  Pérsia. Que citem o texto da lei. Que mostrem o código dos persas. Mas ainda que o provem eu não acreditarei — Direi que é mentira. Porque não seria possível, não é da natureza humana elaborar uma lei que contradiz e ultraja a natureza. Lei que aniquilaria o gênero humano se fosse literalmente observada. Práticas vergonhosas toleradas pelas leis do país! Sexto Empírico, que duvidava de tudo, devia duvidar dessa jurisprudência. Se vivesse em nossos dias e visse dois ou três jesuítas abusarem de alguns escolares, teria direito de concluir ser tal depravação permitida pelas constituições de Inácio de Loiola?

Era tão comum o amor entre rapazes  em Roma que ninguém pensava em puni-lo. Otávio Augusto, esse assassino devasso e  poltrão  que teve o desplante de exilar Ovídio, achou muito natural que Virgílio cantasse Aleixo e Horácio escrevesse odes a Ligurino. Não obstante, sempre subsistiu a lei Scantínia,  preventiva  da pederastia. Repô-la em vigor o imperador Filipe, que expulsou de Roma os meninos que se dedicavam ao ofício. Enfim não creio que em tempo algum nação civilizada haja lavrado leis contra os próprios costumes.

Dicionário Filosófico (1764)* Voltaire (1694-1778)
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Dicionário Voltaire - Amor Próprio


Um mendigo dos arredores de Madri esmolava nobremente. Disse-lhe um transeunte:
O sr. não tem vergonha de se dedicar a mister tão infame, quando podia trabalhar?
Senhor, — respondeu o pedinte — estou lhe pedindo dinheiro e não conselhos. — E com toda a dignidade castelhana virou-lhe as costas.
Era um mendigo soberbo. Um nada lhe feria a vaidade. Pedia esmola por amor de si mesmo, e por amor de si mesmo não suportava reprimendas.
Viajando pela Índia, topou um missionário com um faquir carregado de cadeias, nu como um macaco, deitado sobre o ventre e deixando-se chicotear em resgate dos pecados de seus patrícios hindus, que lhe davam algumas moedas do país.
Que renúncia de si próprio! — dizia um dos espectadores.
Renúncia de mim próprio? — retorquiu o faquir. — Ficai sabendo que não me deixo açoitar neste mundo senão para vos retribuir no outro. Quando fordes cavalo e eu cavaleiro.

Tiveram pois plena razão os que disseram ser o amor de nós mesmos a base de todos as nossas ações — na Índia, na Espanha como em toda a terra habitável.
Supérfluo é provar aos homens que têm rosto. Supérfluo também seria demonstrar-lhes possuírem amor próprio. O amor próprio é o instrumento da nossa conservação. Assemelha-se ao instrumento da perpetuação da espécie. Necessitamo-lo. É-nos caro. Deleita-nos — E cumpre ocultá-lo.

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Dicionário Voltaire - Amor


Amor omnibus idem(2). Cumpre recorrermos à imagem. O amor é a estopa da natureza bordada pela imaginação. Quereis ter uma idéia do amor? Vede os pardais do vosso jardim. Vede vossos pombos. Contemplai o touro que levam à novilha. Admirai aquele soberbo cavalo que dois de vossos camaradas conduzem à égua que  passiva  o  espera e arreda a cauda para recebê-lo. Observai como seus olhos chamejam. Ouvi seus relinchos. Admirai aqueles saltos, aquelas curvetas, aquelas orelhas em pé, aquela boca que Se abre com ligeiras convulsões, aquelas narinas aflantes bafejando inflamadamente, aquelas crinas que se empinam e esvoaçam, o movimento  imperioso com que se lança sobre o objeto que lhe destinou a natureza.
Mas não os invejeis. Pensai nas vantagens da espécie humana. Que contrabalançam força, beleza, ligeireza, impetuosidade todos os predicados de que a natureza dotou os irracionais.
Há animais que não conhecem o gozo. Carecem desse prazer os peixes escamados. A fêmea lança sobre a vasa milhões de ovas e o macho que as encontra fecunda-as com o sêmen sem preocupar-se com a dona.

A maioria dos animais que se acasalam não experimenta prazer por mais que um único sentido. Satisfeito o apetite está tudo acabado. Nenhum animal senão vós conhece os afagos. Todo o vosso corpo é sensível. Vossos lábios sobre tudo experimentam uma volúpia inexaurível — prazer exclusivo da vossa espécie. Enfim podeis amar em qualquer tempo, enquanto os animais só o podem em épocas determinadas. Se refletirdes nestas preeminências direis com, o conde de Rochester: “O amor, em um país de ateus, faria adorar a Divindade”

Como recebeu o dom de aperfeiçoar tudo o que lhe concedeu a natureza, o homem aperfeiçoou o amor. A higiene, o cuidado com o próprio corpo, tornando a pele mais delicada, aumentam o prazer do tato. O zelo da própria saúde faz mais sensíveis os órgãos da volúpia.
Todos os outros sentimentos de presto se amalgamam com o amor como metais em fusão com o ouro.
Vêem reforçá-lo a amizade, a estima. São outros elos de união os dotes do corpo e do espírito.

Nam ƒacit ipsa suis interdum ƒamina ƒactis, morigerisque modis, et mundo corpore cultu, ut ƒacile insuescat secum vir degere vitam. (Lucrécio, liv. 4).

Principalmente o amor próprio estreita esses liames. Palmeamo-nos a própria escolha, e as ilusões em chusma são ornamentos dessa obra  de que a natureza lançou os alicerces.

Eis o que possuís de  superior  aos  animais. Se, porém, fruís prazeres que eles desconhecem, também quantos sofrimentos padeceis  de  que eles nem têm idéia! O que há de horrível para vós é haver a natureza em três quartos da terra envenenado os prazeres do amor e as fontes da vida com um mal tremendo, a que só o homem está sujeito e que lhe infecciona os órgãos da geração.

Esta peste não é como tantas outras doenças filhas de nossos excessos. Não foi a dissolução que a introduziu no mundo. As Frinéias, as Laíses, as Floras, as Messalinas não  foram vítimas dela. Nasceu em ilhas onde os homens viviam na inocência e de lá propagou pelo mundo antigo.

Se alguma vez se pôde acusar a natureza de desamar a própria obra, de contradizer o próprio plano, de tramar contra os próprios fins, foi então. Não tínhamos o melhor dos mundos possíveis? Se César, Antônio, Otávio não foram vítimas desse mal, por que o foi Francisco I? Não, direis, tudo foi disposto da melhor forma possível. Quero crer. Mas é difícil.

Dicionário Filosófico (1764)* Voltaire (1694-1778)
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